"Aquele que nunca viu a tristeza, nunca reconhecerá a alegria."
— Khalil Gibran
A música alta de meu despertador soou por todo o quarto. Abri os olhos, porém o sono e cansaço deixaram-me com a sensação de que o ar estava pesado.
Sem qualquer vestígio de energia em meu corpo, levanto-me e caminho lentamente até o banheiro. Coloco as mãos na beirada da pia, apoiando quase que todo o meu peso sobre a mesma e encaro o meu reflexo no espelho. Meu semblante parece cansado, olheiras encontram-se abaixo de meus olhos e a maquiagem que eu não havia tirado antes de dormir está borrada. Meu cabelo está alto e todo o peso do mundo parece estar sobre meus ombros nesse momento.
Minha mente vagou e acabei lembrando da briga de Justin e Cameron, e sem querer, uma sensação de raiva me tomou completamente. Eu estou irritada e intrigada, não conseguira dormir direito por conta disso.
Respiro fundo e solto o ar sem pressa.
Ligo a torneira da banheira e a deixo enchendo enquanto escovo os meus dentes e faço minha higiene. O meu nível de bipolaridade está bem elevado hoje. Estou naqueles dias e isso provavelmente deve estar contribuindo para o meu mau-humor extremamente alto.
Tirei o blusão em que eu me encontrava e coloquei-o no cesto de roupas, junto com minha calcinha. Amarro o meu cabelo, desligo a torneira e entro na banheira, sentindo o peso em meus ombros irem embora e eu relaxo, deixando com que meu corpo afundasse um pouco mais. A água triscou em meu queixo.
Lembro-me novamente do diálogo da noite passada e tensão concentra-se em meus ombros novamente. Contei até três e afundei mais o meu corpo; a água estava na ponta do meu nariz.
Meus olhos se fecharam e eu tenho certeza de que cochilei por uns bons dez minutos.
Meu carro!
A mesma sensação me toma pela terceira vez e eu tenho vontade de afundar todo o meu corpo e ficar ali, apenas esperando aquela maldita sensação passar.
Infelizmente, não passou...
Quando sai da banheira, as pontas de meus dedos encontravam-se enrugadas e só então percebi que fiquei por mais de uma hora no banheiro.
O meu humor não está bom e o tempo também está contribuindo. O dia está cinza, frio, triste e vazio, então, peguei o primeiro moletom(1) que vi em meu closet e me vesti. Peguei um óculos escuro e o coloco pendurado em minha blusa. Pego meu celular e coloco no bolso, descendo as escadas.
Escrevi um bilhete para Kath e deixei grudado na geladeira. Pego as chaves de casa em cima do balcão e saio, trancando a porta. Coloquei os óculos em meu rosto, apenas para esconder as olheiras e caminho preguiçosamente em direção a casa de Justin.
Eu estou completamente desligada. Minha mente vagava por um planeta diferente, um mundo paralelo, uma outra dimensão.
Ao dobrar a esquina da casa de Justin, eu pude sentir meu coração bater um pouco mais acelerado, minha respiração se descompassou e sento o ar escapar de meus pulmões por alguns segundos.
Os seguranças contataram a dona Pattie, que autorizou minha entrada sem hesitar. Ela me esperava na porta.
— Angel, querida! — ela disse animada e correu em minha direção, com os braços abertos e um sorriso contagiante estampado em seu rosto. — Como vai? — ela perguntou e puxou-me para um abraço apertado e extremamente aconchegante.
— Não muito bem, mas isso vai passar — murmurei baixinho, retribuindo seu abraço.
— Eu não vou perguntar o que aconteceu, mas saiba que se quiser, eu estou aqui — ela segurou em meus ombros e me afastou, olhando-me. Mordi o lábio inferior.
— Eu sei. Obrigada — um pequeno sorriso apareceu no canto de meus lábios. — Justin está?
— Está, sim. Ele está lá em cima, no quarto. Pode ir lá, se quiser — ela sorriu outra vez.
— Tudo bem — disse e entrei na casa.
Subi as escadas sem muita pressa e caminhei até o quarto de Justin. A porta está encostada, o que facilitou um pouco mais para mim, pois eu não estou com a mínima vontade de bater.
Sem muito esforço, empurrei a porta devagar, o que a fez ranger. Entrei na ponta dos pés quando vi que Justin dormia.
Seu semblante é tranquilo e ele sorri enquanto dorme. Passo os olhos por todo o quarto e avisto as chaves do meu carro em cima de seu criado-mudo. Com cuidado e sem fazer muito barulho, caminho até lá e pego minhas chaves.
Enquanto caminho em direção a porta, ouço:
— Angel? — gelei. Meu coração bate rápido e minha respiração começa a falhar. Suspirei baixinho.
— Hum, eu... Eu vim buscar o meu carro e não quis te acordar, desculpe — digo antes que ele fale mais alguma coisa.
— Ei, olha para mim — ele pediu, mais rouco que o normal. Viro-me lentamente e o encaro.
Ele está tão lindo. Seu cabelo alto e bagunçado, sentado com pernas de índio sobre a cama, os olhos ainda espremidos por conta da claridade, sem camisa. Ele se levantou e andou em minha direção com passos lentos. Quando chegou perto de mim, delicadamente, ele pegou meu queixo e olhou fundo em meus olhos. Seus olhos brilhavam.
— Quero que saiba... — ele disse baixinho, mordendo o lábio inferior. — Que eu vou te dar o seu tempo e vou te esperar, eu tenho todo o tempo do mundo.
Suas palavras me derretem. A vontade de beijá-lo é enorme, mas eu ainda estou bem confusa e acima de tudo, irritada, para tal ato.
— Vale a pena esperar por você.
Por mais que eu estivesse brava com ele –ou pelo menos apenas pensar nisso–, eu ainda senti e até mesmo ouvi, meu coração bater rapidamente e a vontade de abraça-lo e simplesmente dizer que eu não estava brava com ele, é assustadora.
— Eu... tenho que... ir — gaguejei, sentindo as minhas mãos soarem.
— Tudo bem — ele suspirou. — Seu carro está na garagem — ele disse e deitou-se novamente.
Desci as escadas, dessa vez, com pressa. Passei na cozinha para me despedir da dona Pattie e depois fui para a garagem. Coloquei a chave na ignição e dei a partida. Os seguranças abriram o portão e eu sai rapidamente.
— O que aconteceu com você? — Kath perguntou espantada, escorada na porta aberta do meu quarto, quando me viu deitada em cima da cama.
— Eu só não estou tendo um bom dia, só isso — forço um sorriso.
— Quer ficar sozinha? — ela passou a língua entre os lábios.
— Por favor — disse com a voz trêmula.
Kath assentiu e puxou a porta, fechando-a. Uma puta vontade de chorar me atingiu e eu simplesmente não pude conter isso. As lagrimas vinham naturalmente e eu só deixava-as livre.
Ouvi o celular de Kath tocar e presto atenção em sua conversa. Era Kyle, pois ela falava “amor” e ria a todo momento.
— Eu não posso hoje, Kyle, desculpa mas minha amiga precisa de mim — ouvi Kath falar. — Eu não sei o que ela tem, mas sei que ela não está nada bem.
Virei para o outro lado e fechei os olhos, dormi em seguida, sem querer.
— Onde você vai? — Kath perguntou assim que me viu descer as escadas.
— Eu... eu não sei. Só vou sair — disse pegando as chaves do carro e de casa em cima do balcão.
— Quer que eu vá com você?
— Não, não precisa. De verdade — balanço a cabeça. — Volto mais tarde.
Kath assentiu e eu sai em direção ao meu carro e entrei no mesmo. Eu queria apenas pisar no acelerador e dirigir para um lugar longe, tentar simplesmente, deixar e esquecer a vida que eu levo nessa cidade. Queria simplesmente, sumir...
Dirigi sem rumo pela cidade e acabei parando em frente a um parque abandonado. Quando abri a porta para sair do carro, alguns pingos de chuva chocaram-se contra a lataria do meu carro e eu entro novamente, prestando atenção na chuva que caia no vidro.
Meu celular vibrou no banco ao meu lado, avisando-me que uma mensagem do Matt acabara de chegar. Nela, Matt dizia que estava preocupado comigo, pois soubera da briga da noite passada e que Kath havia ligado para ele dizendo que eu saí e que estava com medo de que eu fizesse algo imprudente. Mas, dizia também que, eu poderia ligar para ele, não importando-se com a hora que fosse, mas que ele estaria ali comigo.
Mordi o lábio inferior, deixando escapar um sincero sorriso no canto de meus lábios, o primeiro, na verdade.
Coloquei meu celular no banco ao lado novamente e só então percebi papéis por jogados ali. Peguei uma das várias folhas e li atentamente as coisas escritas ali. Era uma música, de Justin.
— They try to get at me, behind your back, trying to tell me that I’m just like the others but I ain’t all bad — cantarolei o que achei ser o refrão.
A sensibilidade e a letra bem desenhada denunciava que aquelas composições pertenciam à Justin. Peguei mais algumas folhas e as li. As músicas eram todas tão sentimentais que eu pude sentir algumas lágrimas formarem-se no canto dos meus olhos.
Suspirei e deixei as folhas de lado, dei a partida e dirigi para casa novamente.
— Angel, o que aconteceu? Onde você estava? — Kath perguntou aparentemente preocupada.
Eu simplesmente não estou afim de conversar, nem mesmo com a minha melhor amiga, então eu apenas subi as escadas, ignorando todas as perguntas que ela atirava para mim enquanto eu subia as escadas. Entrei em meu quarto e tranquei a porta, logo sentindo mais lágrimas em meus olhos.
Eu não quero chorar, mas parece que todas as coisas que guardei dentro de mim, todos os sentimentos ruins, estão vindo à tona e eu me permiti chorar.
Está tudo ruim, é um dia ruim...
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