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História Soneto Proibido - XLVIII - Me cortejando... Que disparate!


Escrita por: larihexney

Notas do Autor


Olá, pessoal! Como vocês estão?
Eu estou bem, graças aos céus. Prossigo me cuidando e suplico para que vocês façam o mesmo! Espero que a gente vença isso logo!
Gente, Soneto Proibido tá com capa nova! Confiram e me digam o que acharam!
Quero agradecer aos novos favoritos (sejam bem-vindos e sintam-se à vontade para aparecer nos comentários quando quiserem) e aos comentários do capítulo anterior que motivaram MUITO!
Esse capítulo tá polêmico e eu não vou mais atrapalhar vocês... Boa leitura!

Capítulo 49 - XLVIII - Me cortejando... Que disparate!


Na quarta-feira, um pouco depois das 16h, eu despertei do cochilo da tarde um pouco sobressaltado. Não lembrava bem, mas sabia que havia tido um pesadelo. 

Com o coração um pouco acelerado e a pele arrepiada por conta do frio que fazia e também em razão da minha falta de roupas, eu levantei, despejei um pouco de água da jarra que ficava sobre a escrivaninha no copo e bebi, esperando meus batimentos se acalmarem. Assim que me senti mais tranquilo, peguei meus escritos e uma caneta, que estavam em cima da escrivaninha atualmente repleta dos livros que adquiri dois dias antes.

Na segunda-feira, depois que Lucca e eu regressamos do almoço com o marquês um tanto reguenguele e esquisito, nós passamos todo o tempo até o jantar trancados no quarto, explorando um ao outro. Depois da última refeição, houve mais uma sessão de beijos que evoluiu para toques, depois sussurros que suplicavam por mais contato, até que tudo ficou nublado o suficiente para que eu lembrasse apenas da boca do outro pelo meu corpo inteiro antes que eu tivesse um dos melhores orgasmos da minha vida. E então, desde aquela noite, depois de ver Lucca adormecer, eu estava escrevendo cerca de três sonetos por madrugada.

Nunca antes estive tão inspirado e estava aproveitando isso o máximo que podia. Apesar de pensar que o Rio de Janeiro me deslocava devido ao seu requinte intimidador, eu também tinha conseguido obter algumas simplicidades nas ruas, observando algumas pessoas e percebendo os contrastes que, de repente, não afastavam tanto a capital das demais cidades do país, especialmente Tiradentes. Havia semelhança até mesmo entre as condições de vida dos trabalhadores, e isso foi visto, principalmente, durante nossa saída no dia anterior, quando eu e Lucca fomos visitar a plantação de café do marquês.

Ao longo da manhã que passamos perto dos lavradores, andando pelos dois depósitos abarrotados de sacas de café e vendo de perto a riqueza de Aluísio, que não chegava a contemplar seus trabalhadores nem sequer minimamente, recordei a época em que trabalhava para o duque. Ele também era mão de figa, preocupado em fazer fortuna sem se importar com quem verdadeiramente fazia o trabalho manual. Tão desgraçado que a vida tratou de puni-lo em vida, lembrei-me. Mas, parecia ser um mal maior, já que o marquês não parecia ser malvado como César – apesar de eu não lhe dar nenhum crédito porque sabia como os nobres costumavam ser –, ainda que agisse do mesmo modo cruel a quem tanto devia.

Independentemente de seus méritos e deméritos, o que eu sabia é que havia sido ali, na propriedade do marquês Aluísio, que eu consegui me sentir mais à vontade no Rio de Janeiro, após conseguir ver a realidade do Thomas de antes refletido no dia de trabalho dos demais camponeses. E isso se devia sobretudo a Lucca, que na tentativa de fazer com que eu estivesse confortável, tinha comentado que havia aprendido a montar cavalos comigo quando avistou um pequeno estábulo próximo às plantações e fez com que eu voltasse meses no tempo, lembrando nossos primeiros dias de convivência, ainda em Prados. O que seria apenas uma manhã de visitas, estendeu-se a uma tarde de almoço na residência do marquês e, posteriormente, a um passeio a cavalo.

Durante quase um dia inteiro até que estivéssemos de volta ao hotel, não nos tocamos, não conversamos sem a presença de formalidades e não ficamos sequer um momento a sós. O marquês estava mesmo disposto a nos recepcionar e isso pareceu elevar a confiança de Lucca, pois sua atenção a nós ao decorrer do dia era um indicativo claro de que ele valorizava bastante o acordo que seria firmado e fazia mesmo questão de ter o barão como seu parceiro de negócios.

Todavia, não deixou de passar pela minha cabeça que ele poderia apenas ser um pouco menos falastrão, porque a cada vez que ele abria a boca para tagarelar, eu já me sentia cansado. Cheguei a comentar isso com Lucca quando estávamos tomando banho juntos, depois de horas sem sentir o cheiro um do outro de perto.

Oh, sim, eu estava ficando rapidamente mal acostumado.

— Por Deus, nem me diga. – Ele concordou comigo. — Eu deveria adivinhar que ele não era tão comedido como se mostrou inicialmente no baile. No fim, os trajes exóticos serviram de aviso. – Completou, fazendo-nos rir.

Depois daquele banho, pedimos o jantar no quarto e mal conseguimos terminar de comer para tão logo estarmos nus na cama, matando uma saudade que não era possível de explicar racionalmente, afinal, nós estivemos juntos todo o dia. Ainda assim, era saudade. Prendia meu peito com angústia tal como a que eu sentia quando passava um dia sem vê-lo, mas aliviava o meu coração sempre que ele se prendia a mim em um abraço, beijo ou os dois simultaneamente enquanto eu ficava preso nas suas pernas. O mais curioso era que o sentimento descabido não vinha apenas de mim. Lucca me correspondia em tudo.

Aqueles dias ao lado dele estavam me tornando quase um especialista em notar suas feições, prever suas reações, entender seus silêncios. E, na noite anterior, antes de dormir e depois de escrever, eu percebi que ele estava quieto enquanto lia, mas claramente não prestava atenção nessa atividade, uma vez que hora ou outra eu sentia seus olhos sobre mim enquanto me dedicava à escrita. Sabia que ele gostava de me observar e, sem nenhum rastro de modéstia, ficava orgulhoso pra caramba com isso. Mas esse olhar seu, insistentemente silencioso, tinha me incomodado pela manhã depois de termos nos acariciado e gozado juntos.

Quando perguntei se havia algo errado, ele apenas desconversou, dizendo que estava preocupado em saber se conseguiria falar com Gregório.

Graças ao milagre chamado telefone, que eu só havia visto uma vez antes de vir ao Rio de Janeiro, no Palácio Governamental em Tiradentes, Lucca havia descoberto um modo de se comunicar rapidamente com Gregório. E o motivo de tanta urgência era porque a denúncia que apontaria César como assassino do antigo proprietário da fazenda que ele tomou posse por anos em Prados seria feita hoje, ou melhor, chegaria hoje até a justiça tiradentina, por meio de uma carta enviada por uma testemunha que era da confiança do filho de Seu Durval. Lucca estava ansioso por saber se seria notícia de primeira hora ou se a informação demoraria a se espalhar.

Entretanto, por mais que eu acreditasse que ele estava interessado no assunto assim como eu, sabia que não era esse o verdadeiro motivo de seus olhares carregados de contenção para mim.

Fiquei inconformado.

Compartilhávamos tudo, ora, eu não entendia o que poderia haver para ele querer se conter! 

Mesmo intrigado, fiz um esforço e resolvi que não tocaria no assunto. Por isso, depois do almoço e de mais uma sessão de beijos, toques, sussurros e orgasmos, nós cochilamos, mas antes ele me deixou avisado que, caso eu acordasse e ele não estivesse, eu poderia encontrá-lo em seu quarto, tentando falar com Gregório.

Escrevi por cerca de meia hora até que o som de passos veio do banheiro e Lucca surgiu no aposento, totalmente vestido e agasalhado, ao contrário de mim que estava despido mesmo sentindo frio. Ele se aproximou, se posicionou atrás da cadeira, espiou o que eu escrevia por alguns segundos antes que eu o repreendesse e colocou as mãos no meu cabelo antes de puxar suavemente meu pescoço para trás e deixar um beijo demorado nos meus lábios. 

Um beijo de ponta-cabeça. Isso era novo.

— Hum... – Eu meio reclamei, meio gemi quando ele se afastou e foi até a cama para apanhar a coberta e colocá-la sobre os meus ombros. — Obrigado. – Sussurrei, puxando sua mão para deixar um beijo na palma.

— Estou adorando descobrir o quão terno você pode ser sem partir para os seus jogos desleais. – Provocou-me com um sorriso lindo. Dei de ombros.

— Sempre fui terno com você, mas por vezes o seu corpo trata de invocar meu instinto voraz. – Fingi um suspiro de lamentação. — Não consigo lutar contra isso. 

— Nem eu quero que lute. – Disse, convicto. 

Sorri para ele e mantive sua mão em contato com minha pele, unindo-a a minha própria.

— Conseguiu falar com Gregório? – Perguntei assim que lembrei.

— Sim. Precisou que um menino fosse o chamar para ir até a sede porque ele tinha ido mais cedo e haviam informado que a linha não estava funcionando.

— Mas você ligou mais cedo pedindo para falar com ele e disseram que ele não estava. – Franzi o cenho, estranhando a situação.

— Sim. Não sei o que houve. – Ele disse, o tom de estranhamento também em sua voz. — Mas o importante é que consegui falar com ele e está tudo bem por lá. A carta chegou. – Anunciou para mim, não escondendo a felicidade com a notícia.

— Ah Deus, que bom! – Comemorei. — Espero que César apodreça na prisão pagando por tudo que fez.

— E ele vai! Depois de todo sofrimento que causou, é o que ele merece. Embora a denúncia ainda não tenha chegado até os jornais, parece que amanhã, a essa hora, Tiradentes e região já estará sabendo quem é o duque César de Medeiros. – Disse, entusiasmado.

Sorri com sua felicidade.

— Estou orgulhoso de você. – Confessei. — Você foi corajoso desde o início, ajudou como pôde, mesmo sabendo que se o duque ou seu tio descobrissem, provavelmente você estaria em apuros. Honrou a família do falecido senhor Lopes. Honrou o Seu Durval. Honrou a mim. Ajudou a fazer justiça... Me orgulho muito de você, Lucca. – Fui sincero.

Seus olhos agarraram os meus e sua mão estreitou ainda mais o aperto que tinha com a minha. 

— E eu faria tudo de novo, mesmo que fosse apenas para ouvir isso de você de novo e de novo. – Declarou, sua voz intensa e carregada de emoção. Senti o ar ficar escasso no mesmo minuto. — Parece que temos motivo para comemorar, não acha? – Questionou, sorrindo sedutoramente.

Assenti de imediato e me levantei ligeiro, pronto para debruçar-me sobre ele até que estivéssemos de volta na cama. Contudo, assim que passei meus braços por seus ombros e enlacei seu pescoço, Lucca me afastou pela cintura, rindo.

— Ah, não. Não esse tipo de comemoração. – Ele disse, desviando dos meus lábios para beijar a ponta do meu nariz. Meu cenho franziu. Não escondi minha frustração e minha curiosidade, ambas mescladas e traduzidas na minha face. — Sairemos essa noite. – Comunicou, respondendo ao meu questionamento não feito.

— E para onde? – Perguntei, a irritação no meu timbre quase reformulando a pergunta: para que raios de lugar iríamos com a certeza de que seria melhor do que estarmos juntos aqui?

— É uma surpresa. – Disse simplesmente antes de se afastar e ir rumo ao seu quarto conjugado. — Estarei de volta aqui às 19h. Não tomaremos banho juntos para não haver riscos de nos atrasarmos. E, ah, use o chapéu que lhe comprei. Desconfio que estejamos no meio de uma sociedade da mais alta classe. – Concluiu, não podendo me deixar mais irritado com suas palavras.

Era muito desgosto abandonar aquele quarto imenso, aquela cama confortável, aqueles lençóis aquecidos por uma noite com gente de nariz em pé. Eu não podia acreditar que essa era uma forma de comemoração.

Parecia mais um castigo!

Que desfeita, Lucca, era tudo o que eu podia pensar.

Que desfeita!

 

°°°

Pontualmente às 19h, eu pus meus pés para fora da habitação. Estava com as melhores vestes desde que havia pisado no Rio de Janeiro e, embora fosse contrário a tanta sofisticação para passar o tempo com pessoas esnobes, que certamente me olhariam de cima a baixo se eu me vestisse como estava acostumado no cotidiano, eu dei o braço a torcer e até me senti bonito, meio engomadinho. 

Normalmente, as colorações das minhas roupas variavam de branco e cinza para o marrom ou preto. Porém, minha mãe havia providenciado um tecido azul marinho e com ele me aprontou um suspensório e uma calça, além de um terno da mesma cor, que foi sobreposto à minha camisa branca. O chapéu que Lucca me comprou chegou até a combinar com o restante da veste, já que a cor preta do acessório não fazia contraste com o tom de azul. Com todo o traje, eu parecia formidável e moderno. 

Terminada a autoinspeção, olhei para a porta do quarto de Lucca a tempo apenas de vê-lo sair, exalando elegância, como eu imaginei. Seu cabelo estava penteado para trás e sua barba tinha sido feita, ainda que não completamente – havia ali um restolho que eu desconfiava que fosse apenas para me atormentar mais tarde. Seu terno tinha acabamento em dourado e valorizava seu peitoral, assim como a calça, um pouco mais justa do que o normal, insinuava certo volume nas partes baixas. Contive um suspiro quando olhei para ele uma última vez antes de falar.

— O senhor aparenta muito bem, barão. – Fui formal, objetivando incitar o homem.

— Não mais que você, senhor Facchin. – Ele retribuiu o elogio, mas não foi tão cuidadoso em seu olhar como foi com as palavras.

Mordi o lábio inferior e desviei o olhar do seu, reusando-me a terminar de acompanhar para onde seus olhos iam ao longo do meu corpo. Aquele era um jogo que eu não poderia ganhar em público, logo, não havia razão para ao menos tentar e acabar me encrencando. Então, decidido a me comportar, sugeri que descêssemos, alegando estar curioso para descobrir a que lugar ele me levaria.

Acatando prontamente, o barão percorreu o corredor e desceu as escadas em um silêncio cauteloso, mas repleto de uma energia lasciva que me excitou. Estava acontecendo com mais facilidade naqueles últimos dias e, pelo modo como o outro segurou seu chapéu com a mão ao chegar na recepção para solicitar um veículo, eu sabia que ele estava semiduro da mesma maneira que eu. 

Meus dedos coçaram para tateá-lo.

— Barão Vasconcellos, o seu veículo chegará em cerca de cinco minutos. Como cortesia do senhor Paiva, o melhor modelo foi disponibilizado para o senhor. Desfrute! – O recepcionista disse, sorridente.

Fitei Lucca no mesmo instante.

— Senhor Paiva? – Franzi o cenho para ele, convicto de que o recepcionista estava equivocado. Nunca tinha ouvido falar de nenhum senhor Paiva.

Lucca chegou a abrir a boca para explicar, seu semblante nem um pouco confuso ou intrigado como o meu, apenas positivamente surpreso. No entanto, antes que ele falasse, um homem alto, magro e cheio de marcas de expressões surgiu no espaço que nos separava.

— Boa noite, senhores. – Cumprimentou, sorrindo e, como consequência, fazendo com que várias covinhas aparecessem em seu rosto. Não era adorável, mas combinava com o seu rosto e dava a ele um aspecto atraente. — Barão Lucca, espero que aceite de bom grado o meu presente. Deixei sob aviso que, caso o senhor saísse hoje, deveria ir no melhor modelo de automóvel presente no Brasil.

— Senhor Xavier, fico-lhe muito grato com essa cortesia, mas não havia nenhuma necessidade. 

— Como não? Veja só, – Ele se voltou para mim, seus olhos me analisando com minúcia em menos de dois segundos. — se não fosse pelo barão, eu perderia minha carteira hoje de manhã. Eu já estava subindo para o meu aposento quando ele viu que eu, descuidado como sou, a deixei cair e me sinalizou. 

— Qualquer homem honrado faria o mesmo. – Lucca recusou a devoção no tom do outro.

— Qualquer homem com honestidade nobre. – Corrigiu o tal Xavier. — Portanto, aceite a cortesia. 

— Já que é assim... – Lucca ergueu a sobrancelha em conformidade, desconcertado. — Aceito sim, senhor Xavier. Aproveito a deixa para apresentar-lhe ao meu assistente, Thomas Facchin. 

— É um prazer, senhor Facchin. – Ele disse assim que eu apertei sua mão em cumprimento.

— Igualmente, senhor Paiva.

— Ele é bastante novo, impressiona-me que já trabalhe como assistente de um barão. Aqui os jovens garotos só possuem olhos para a noite na cidade, especialmente para as confeitarias, bordéis e os grandes salões. Vejo que o senhor é diferente, senhor Facchin. 

Engraçado, eu também vejo que o senhor é diferente. Parece-me como um tipo novo de um intrometido, minha língua pinicou para dizer.

Lucca, intuitivo como era comigo, demonstrou notar minha expressão austera para o intruso que havia conseguido me fazer perder a excitação, pois tratou de responder ao senhor Paiva antes que eu tivesse a chance.

— Sim, ele é bastante novo e competente. Destaca-se dos demais trabalhadores que possuo. Uma espécie de prodígio. – Lucca disse, simpático e calmo, tal como um santo.

— Que interessante! Qual o seu talento, senhor Facchin?

Vários, basta perguntar ao barão.

— Não sei se posso considerar um talento sem soar soberbo, mas dedico meu tempo livre a escrever. É o que mais gosto de fazer. – Depois de beijar o barão, decerto.

— Então o senhor gostará muito dos salões literários e dos bares cheios de poetas das mais variadas patentes. Se quiserem, posso guiá-los até um em específico que me apetece muito. – Ofereceu-se, deixando-me surpreso com sua prestatividade.

— Em outro momento, creio que será ótimo fazer esse passeio, senhor Xavier. Mas, agora, temos um outro lugar para ir. E, infelizmente, com horário. Perdoe-me a pressa, mas precisamos ir agora. – Lucca disse, educado e preciso. — Obrigado pelo presente. Tratarei de retribuir, pois é demais para um simples ato. 

— Não me ofenda, barão, por favor. Não há retribuição para um presente de agradecimento. Aproveitem a noite! – Ele disse, despedindo-se.

Caminhamos até a entrada do hotel, seguindo diretamente para o veículo. O modelo, por fora, parecia seguir o padrão dos automóveis que vimos no Rio de Janeiro, sendo a única diferença o tamanho maior. Contudo, a parte interna tinha mais espaço, o banco revestido em couro e um balde com champanhe nos aguardando. Eu e Lucca trocamos um olhar e, dada a surpresa nos seus globos castanhos, não somente eu estava impressionado. 

— Que sujeito agradável! – O mais velho sorriu, analisando a garrafa de champanhe. — Mas não vamos abrir. – Ele disse, me fitando como se me consultasse. — Creio que devemos deixar para a volta. – Concluiu e piscou discretamente para mim.

Corando, eu desviei meu olhar para a janela do veículo, evitando ao máximo olhar para Lucca. E, com as belas paisagens que era possível visualizar enquanto nos deslocávamos, não foi difícil me recompor e me distrair até a chegada ao nosso destino que, por sinal, eu continuava sem saber qual era. Espiando da janela de Lucca quando o automóvel parou, eu permiti que meu queixo caísse com o prédio que avistei.

Assim que desci e caminhei pela calçada, um pouco afastado de Lucca, que provavelmente conversava com o condutor para combinar o horário de volta, minhas mãos começaram a suar. Diante de mim, passavam senhores vestidos com a mais sofisticada alfaiataria. As senhoras ou senhoritas ostentavam grandes chapéus, panos no pescoço e saltos, indicando fidalguia no andar. Todos iam em direção à imponente construção com arquitetura em mármore e vidro que possuía cartazes em sua fachada, não me deixando dúvidas de que eu estava diante de um teatro pela primeira vez na vida.

— Este é o Teatro São Pedro, Tom. – Lucca disse, parando ao meu lado para observar. — É o mais antigo do Rio de Janeiro. E, pela primeira vez, acontecerá aqui a apresentação de uma ópera com artistas brasileiros e franceses. Não é fantástico? – Perguntou-me, animado.

Era fantástico.

E bastante assustador, porque eu não fazia a menor ideia de como me comportar em um teatro. 

Virei-me para encontrar o olhar de Lucca, obstinado em saber por que ele não me disse antes que viríamos a um lugar tão chique assim. Sentia-me aflito, inseguro, temeroso de cometer alguma falha e odiava esse fato. Odiava mais ainda estar aborrecido por saber que o mais velho poderia evitar tudo aquilo se me comunicasse antes para onde estávamos indo.

Mas, assim que nossos olhos se cruzaram, perdi a coragem de dizer como me sentia. Ele me mirava com tanta afeição e tanta expectativa que ficou claro no mesmo instante que tudo o que estava fazendo era para mim.

Suspirei, vencido.

— É mais que fantástico. – Eu disse, sorrindo de modo complacente. — Mas eu não faço a menor ideia do que vou encontrar. – Confessei em sussurros.

— Isso não é um problema. Eu estou aqui. – Disse, me encarando profundamente. — Eu te guio. – Assegurou. 

Apenas assentindo enquanto sentia o restante do meu corpo amolecer com as palavras do homem mais fabuloso que eu conhecia, tratei de inalar um bocado de ar para manter a respiração estável assim que ele caminhou na minha frente. Seguindo-o, como era sua vontade, eu adentrei o espaço gigantesco, deparando-me com uma pequena fila para comprar um bilhete.

Antes que eu pudesse me perfilar, Lucca seguiu para um corredor com paredes forradas com um tecido que eu não sabia identificar, mas possuía adornos com fiapos grossos de ouro. Impressionado, mas não surpreso, eu testemunhei o barão entregar dois bilhetes a um homem que nos deu acesso a uma escada de dois andares depois de um cumprimento educado. E foi no topo dessa escada que eu perdi o fôlego quando vi a sala principal toda pintada de branco e ouro aparecer debaixo dos meus olhos, repleta de assentos e exibindo um grande palco. À medida que as pessoas se acomodavam e as luzes do teatro se acendiam, mais hipnotizante ficava a vista do grande espaço.

Era, sem dúvida alguma, o lugar mais bonito que eu já tinha pisado. 

— Vamos nos acomodar? Não demorará para a ópera começar. – Lucca tocou gentilmente o meu braço e eu discretamente olhei para os lados, checando se era seguro permitir sua proximidade.

Antes que eu pudesse lidar com seu olhar bem-humorado, certamente achando graça da minha cautela, me flagrei embasbacado com o lugar que estávamos situados. Ali do alto, com poucos assentos e uma mesa cheia de bebidas e sobremesas variadas, tínhamos uma visão privilegiada do que ocorria em todo o teatro e, em especial, o palco.

— Quanto você pagou por esse lugar? – Perguntei, não me contendo. Apostava que havia sido uma fortuna!

— Essa não é uma pergunta apropriada, Tom. – Disse, seu timbre denotando ofensa. 

— Ora essa! Sou seu assistente, preciso saber quanto o senhor gasta para que eu possa ajudar-lhe da melhor forma. – Redargui instantaneamente.

— Definitivamente não. – Disse, balançando a cabeça em negação com veemência. — Hoje você é meu convidado. Estou te cortejando, senhor Facchin. – Declarou sério, com a maior desfaçatez do mundo. 

Eu corei de novo e me calei, sentindo meu coração se agitar.

Me cortejando... Que disparate!

Não olhei em sua direção e não trocamos uma palavra até as luzes se apagarem cerca de dez minutos depois. Sentados lado a lado no camarote, eu demorei um tempo para entender que ninguém além de nós poderia ocupar os outros lugares disponíveis naquela ala. Estava morrendo de vontade de perguntar a Lucca se ele havia reservado os demais assentos também, com o fito de termos mais privacidade, mas me aquietei, com medo de ouvir uma possível resposta afirmativa acompanhada de mais uma gracinha da sua parte. Minha bochecha ainda queimava.

Pouco tempo depois, a ópera começou e eu fiquei encantado com a versatilidade, os trajes e os cantos dos artistas. Um verdadeiro espetáculo começou a ser reproduzido na frente de centenas de pessoas e eu me encontrei pensando como os artistas conseguiam tamanha desenvoltura perante um grande público. Inicialmente, suspeitei que eu só fosse analisar quão bons eles poderiam ser no improviso, por isso fiquei atento aos possíveis erros. Todavia, acabei preso no enredo e, quando menos esperei, estava rindo junto com a plateia inteira.

Foi quando uma mão pousou na minha perna. 

Estávamos no mais profundo breu, apenas as luzes do palco estavam acesas. Eu sabia que a chance de nos verem eram escassas, mas ainda assim fiquei nervoso.

Tentando ignorar o contato, eu continuei assistindo à ópera, gradativamente mais envolvido com o desenrolar da história contada. Basicamente, a apresentação girava em torno de dois jovens amigos solteiros que eram apaixonados pela mesma mulher e não sabiam. Os demais personagens, que traziam comédia ao espetáculo, eram compositores que se inspiravam no infortúnio dos dois homens para vender peças teatrais.

Estava na cena que antecedia o intervalo, no momento em que um dos jovens afirmou ter dormido com a mulher amada, quando Lucca se esgueirou para sussurrar no meu ouvido:

— Também quero dormir com você. 

— Já dormimos juntos. – Eu sussurrei, rindo, sem desviar o olhar da apresentação.

Na sequência, o ato se voltou para os compositores, que começaram a cantar que a mulher amada foi desonrada, pois abrigou dentro dela a semente da volúpia. A reação da plateia foi um misto de “oh” espantoso e risos despudorados de alguns, inclusive o meu. 

— Veja só, eu... Eu também quero isso. – Lucca voltou a sussurrar e, desta vez, meu olhar foi ao seu encontro.

Mesmo na escuridão, eu conseguia ver com o reflexo da luz abaixo de nós os seus olhos quentes, sensíveis aos meus e receosos. Minha boca ficou seca e eu engoli em seco, tentando saber se eu tinha entendido errado. Talvez eu estivesse imaginando, mas seu olhar, que ao mesmo tempo em que era oscilante era abrasador, dizia-me tanto. 

Dizia-me que ele queria...

— Mas não por simples volúpia. – Explicou de antemão, defensivo e tão baixo que a música abaixo quase me impediu de entender se não fosse pela leitura que fiz de seus lábios. — Eu quero fazer amor com você. 

E, no mesmo momento, o último ato antes do intervalo acabou.

Eu não notei, mas o compositor só chocou a plateia porque tinha errado a letra da música e usado do improviso – e aquele tinha sido o fator determinante para que a ópera se tornasse uma explosão nos jornais do dia seguinte.

Uma semelhante a que estava acontecendo na minha cabeça agora.


Notas Finais


Não esqueçam de me dizer o que acharam, essa reciprocidade sempre me fortalece!
Beijos e até a próxima! Se cuidem e cuidem dos seus! 😘


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