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História Uma suposta facção de balé - Couru


Escrita por: ikus

Notas do Autor


OI, FACCIONÁRIESSSSSSSSSSSSSSS!!! Já de roupinha bunita prontes pra comer muito? (comer muito em ano novo é tradição? por aqui a gente come muito, mas a gente é esfomeado)

Boa leitura e, se gostarem, comentem, porque amo saber o que vocês estão achando!!
#EstrelandoOCoadjuvante

Capítulo 35 - Couru


Ver aquele pedaço de papel tão característico em sua frente pelo quarto dia consecutivo carregava muitas mensagens. O peito de Jungkook apertava cada vez que preenchia seu nome e matrícula.

Eram as provas finais. Pela primeira vez, a palavra que mais o preocupava entre "provas" e "finais", era "finais".

Eram provas finais. Era final do ano; época das competições de dança. Era o fim do ensino médio e do seu tempo para pensar. Eram seus últimos dias tendo um teto apesar do silêncio.

Desde o dia em que negara a conversa, nunca mais esbarrara com a mãe pela casa. Talvez ela e o pai já estivessem preparando a mudança, porque mesmo a escassa existência daquela casa minguara de vez. Novos lanches não apareciam na cesta, mas nunca tinha comido sequer um para ser necessário repor.

Ainda não sabia o que fazer ou dizer. Precisava ser convincente, mas ter falhado naquela noite não era um dos históricos mais encorajadores. E, sempre que começava a pensar no assunto, a incapacidade de traçar qualquer raciocínio lógico fazia visita. Depois, voltava a se concentrar nas provas e nos estudos porque, ali, ao menos, havia resposta certa.

Mais uma vez Jungkook deixou a semana passar, mesmo que isso significasse seu prazo apertando sem fazer nada. Ao menos, ficava bom em se distrair com outros detalhes. Nem parecia tão aflito, apesar de sentir o olhar preocupado do namorado de tempos em tempos. Jungkook sabia que Jimin, no fundo, desejava que resolvesse sua situação com os pais, mas isso não o impedia de usá-lo como distração também.

Abraços, beijos e mensagens carinhosas pelo celular eram um analgésico ótimo. Curavam? Não, só aliviavam; mas era o suficiente para Jungkook. Melhor ainda foi o momento em que Jimin postou sua primeira videoaula. Como esperado, as visualizações eram poucas; porém, para espanto dos jovens, houve uma quantidade boa de comentários pedindo mais, dadas as proporções. E Jungkook, que os leu antes de Jimin, ficou muito feliz em poder repassá-los sem precisar apagar nenhuma mensagem maldosa. Era um sucesso!

Comemoraram na loja de conveniências, com abraços e brincadeiras entre os corredores de guloseimas. Jungkook até mesmo surrupiou um iogurte extra — pelo qual pagaria, claro — para comer com Jimin. Era uma pena a falta de toques durante o trabalho de Jungkook. Gostaria de beijar Jimin até deixá-lo completamente sem ar.

O final de semana também havia virado rotina: ensaiar com a professora aos sábados; treinar a apresentação com o figurino pronto na casa de Hoseok aos domingos. O combinado era aproveitar todos os fins de semana, mas parar antes da competição para evitar lesões e deixar o corpo descansar. Jungkook estava certo de que Jimin o faria alongar todos os dias.

Mas ainda tinha domingos para aproveitar, e ter o figurino em mãos e a música rearranjada por Yoongi transformou a apresentação em outra. E em uma bem melhor. Contudo, toda a melhora gerava complexidade, principalmente com o figurino. Nem mesmo Hoseok, experiente como era, acertou a troca do smile da sua roupa de primeira. Jungkook aprendia, aos poucos, quais movimentos podiam ser aproveitados para virar as lantejoulas vermelhas em pretas; a cada rodada da música, ficava mais natural.

O suor e o cansaço de cada membro do corpo era muito, assim como a sensação de refrescância ao ser servido com o suco de caju da mãe de Hoseok junto a um sanduíche natural, escarrapachado na grama dos fundos. Aliás, conheceu o Sr. e a Sra. Jung, que o salvaram da ligação desconfiada de seus pais, e eles eram ainda mais pacientes, curiosos e alto-astral do que sequer imaginara. Eram inconfundíveis, de maçãs do rosto altas como o tom da voz e um sorriso perene, reconheceria-os como pais do Hoseok mesmo sem serem apresentados como tal.

Naquele dia, sobrou um amargor no fundo de sua boca por não ter nada a ver com seus pais; por não saber nada sobre eles, assim como eles não sabiam nada sobre si. Nada que mais um gole de suco não colocasse para dentro. Focava em compreender a tristeza que sentia, mas achar métodos para conviver com ela.

Os dias voaram como andorinhas voltando ao norte. Cada novo dia incrementava a pilha de apreensão no âmago de Jungkook. Talvez até houvesse se acostumado a sempre estar apreensivo, mas ainda não era uma sensação gostosa. Ao mesmo tempo que queria congelar aquele tempo insistentemente rápido, queria tudo resolvido logo. Queria ser o Jungkook em palco. Queria se transportar para a vida do Jungkook do futuro, sem ter que passar por nada, sem fazer parte do passado. Isso é, se Jungkook do futuro fosse dançarino e namorado de Park Jimin.

No último fim de semana antes da competição, treinou mais leve, tanto com a professora no sábado, quanto na casa de Hoseok, no domingo. A partir de segunda-feira, apenas alongamentos, aquecimentos e marcações leves da coreografia. De fato, não precisava dos dias a mais, cada detalhe da coreografia e das expressões faziam parte de seu corpo. Um corpo com uma técnica mediana, mas muito treino.

Quando voltaram da casa de Hoseok, mais cedo àquele domingo, aproveitaram a visita de Jina e de Bongcha a um amigo para se enfiarem juntos no boxe do chuveiro. Apenas não diziam que aquela era a parte favorita do namoro porque havia tantas partes favoritas: segurar as mãos em uma manhã fria; embalar no sono com a sensação de cuidado fornecida pelos braços alheios; beijar e beijar e beijar até o ar fugir de vez, com qualquer emoção disponível no momento — paixão, tristeza, raiva, medo —; poder ser, o que é que fosse. Aproveitar aquela redoma de compreensão em um mundo cheio de suposições mentirosas. Mas sim, sentir o corpo do outro com o toque escorregadio fornecido pela espuma do sabão junto à água era uma sensação maravilhosa.

Jungkook sentava-se no colchão quando notou Jimin caminhar em direção à escrivaninha. Ele puxou uma gaveta, tirou dela um saquinho translúcido cor-de-rosa e caminhou até a cama para se acomodar ao lado do namorado, que o olhava curioso.

— O que é? — O tom de Jungkook tinha uma animação infantil. Inclinou-se para deixar um beijo no pescoço de Jimin que ria.

— Uns presentinhos bobos para sua competição... — Jimin acomodou as mãos do namorado em seu colo, acariciando as palmas largas antes de deixar o saquinho lá. — É uma cartinha e um amuleto da sorte. A cartinha é para a competição, só pode bisbilhotar no dia! O amuleto da sorte é uma tornozeleira em estilo chinês que minha mãe me deu quando fui competir no kung fu. Eu ganhei, aliás! Acho que pode ser útil.

— Vai ser muito útil, sim, docinho...

Jungkook inclinou-se e buscou a boca alheia com a sua. Mais que satisfeito, Jimin terminou de unir os lábios. O resto foi consequência: deslizar de mãos por corpo, aquecer de bochechas, entrelaçar de pernas, até o beijo findar em um abraço gostoso que passou a ser um abraço contra o colchão e, depois, debaixo de lençóis.

Já acomodado no corpo de Jimin, Jungkook olhou de novo o saquinho rosa, lambendo os lábios. Enfim riu e confessou em um fio de voz:

— Eu tava com tanto medo do dia da competição chegar logo. Não acredito que você tá me fazendo querer que o dia da competição chegue logo.

— Vai passar rapidinho...

— Eu sei, por isso o medo.

— Quer conversar?

— A gente já conversou disso.

— Quer conversar de novo?

— Quero... — Jungkook confessou com uma risada sem graça. Acomodou seu presente na mesa de cabeceira de Jimin e desligou o abajur. Apesar de amar poder ver em detalhes cada característica apaixonante de Jimin — suas pálpebras, bochechas e lábios macios; seu nariz pequeno e reto —, também amava fazer confissões e desabafos no escurinho, sentindo-o pelo hálito quente, pelas mãos firmes e protetoras em seu corpo.

— Ouvindo, gracinha, como sempre.

— Você sempre me ouve tanto... Não cansa?

— De ouvir você? Não mesmo!

— Então ouvir os outros cansa?

— Às vezes, mas acho que é normal, não? Quando você não está acostumado a ouvir uma pessoa, você não sabe o que ela espera de você... Então fico pensando: o que deveria responder? O que deveria fazer? Deveria abraçar? E aí, quando vejo, meus pensamentos não me deixam ouvir nada, então tenho de voltar a me concentrar na escuta. Mas as perguntas ainda ficam no fundo dos meus pensamentos, sabe?

— Hm... Faz sentido... Então você sabe o que eu espero de você?

— Saber certinho não sei, mas sei como você reagiu das últimas vezes e qual dinâmica funcionou.

— Então, o que você faz?

— Bem... Desde que a gente virou amigo e... namorado, eu ouço. Sem pensar em nada, só ouvindo. Depois, abraço. Depois, beijo muito, muito. Você gosta assim, não é? — perguntou, e viu Jungkook assentir a cabeça com um sorriso bobo no rosto. — Depois, eu me dou um tempo para pensar e aí gosto de dar as minhas opiniões sinceras. Essas, eu sei que nem sempre vão ser tão boas de ouvir, mas confio em você para me perdoar em algum momento, apesar de ter medo de falar.

— Às vezes eu fico magoado mesmo... Mas acho que dá certo porque meio que todas suas opiniões são uma forma de me apoiar. Elas me levaram até as aulas de balé e até você, e aí todas as coisas boas ao seu redor.

— Tem coisa ruim ao meu redor também.

— Mas as boas se sobressaem! Enfim, eu amo muito te ouvir, mas tenho que dizer que a gente é bom mesmo nesse negócio de você ouvir e eu te confessar, sabe?

— Fico feliz mesmo em ouvir isso, gracinha...

— Fico feliz mesmo em te confessar isso, docinho...

— A gente é muito bobo! — Jimin riu baixinho, deixando o som minguar para dar espaço aos lábios de Jungkook. Suspiraram, satisfeitos, e ajeitaram o abraço.

— Sim! Gosto de ser bobo com você... Sou tão sério com minha mãe... Não quero ter que falar com ela. E ouvir a resposta dela. Às vezes nem consigo dormir de noite pensando nisso.

— Ah, gracinha, mas é compreensível...

— Eu sei, mas às vezes fico pensando se eu deveria perdoar.

— Mas você acha que consegue? Nós às vezes pensamos que perdoar é fácil, que é só uma decisão. "Vou perdoar" e pronto. Mas a realidade é outra, sabe? Temos memórias e sentimentos.

— Mas se eu decidir perdoar, as memórias e sentimentos não vão começar a pegar leve? Aos poucos?

— Hm... Não sei. Talvez seja o caso, o tempo ajuda mesmo muita coisa. — Ainda pensativo, Jimin aproveitou para beijar as bochechas de Jungkook. — Mas o perdão precisa ser merecido, não acha? Se você contém a mágoa racionalmente até ela ficar mais fraca, de nada adianta se ela for reavivada o tempo todo.

— Hm, agora fiquei com mais medo...

— Desculpa!

— Não, não. Melhor ter medo agora do que ser pego de surpresa depois, acho...

— A gente acha muita coisa.

— Nosso maior inimigo: ter certezas.

— Mas tenho certeza de que te amo — Jimin respondeu, todo faceiro, usando do tom humorado da conversa como ímpeto para confessar. Porém, assim que as palavras saíram, as bochechas enrubesceram e foram escondidas nos ombros de Jungkook.

— Também te amo, docinho...

— Você não acha idiota eu ainda ficar tão sem graça com essas coisas? — perguntou de repente, ainda contra o ombro do namorado.

— Eu? Acho a coisa mais linda e fofa!

— Credo, a gente é muito meloso.

— É, sim. A gente é meloso, brega e bobão.

— Nossa, o Jimin do passado nunca imaginaria estar assim. — Jimin riu. De fato, era muito improvável mesmo.

Jungkook riu de volta e beijou os fios do namorado. Invertendo os papéis, puxou o queixo alheio para conectar os olhares e então sussurrou:

— É? E o que ele acha disso agora?

— Que alguma parte da vida tinha que ser doce mesmo. — Apesar de se esforçar para manter firmeza, desviou o olhar. Mas sorriu com o riso de Jungkook e o beijo recebido na bochecha. Um beijo bem longo.

— Hm, verdade, docinho...

— O que esse tom pensativo quer dizer? — Jimin voltou a olhá-lo nos olhos, perscrutando.

— Eu não consigo escapar mesmo, né?

— Não! Mas você quer escapar? Eu deixo.

— Não, não quero... Só tava pensando que se você é a minha parte doce, talvez eu venha te lamber depois de lidar com a amarga.

— Literal ou figurativamente?

— Os dois — Jungkook disse, sério. Então, lambeu a ponta do nariz de Jimin, que o torceu com uma caretinha antes de rir.

— Assim você vai tirar meu hidratante!

— Tirei mesmo. — Jungkook foi quem torceu o nariz daquela vez, para combinar com o resto da careta do rosto. — O gosto é horrível. Que enganação!

— Da próxima vez me avise; eu passo o gloss de morango, seu favorito.

— Finalmente! Ia fazer greve de beijo já, faz um tempão que você não usa.

— É que eu não gosto de me lambuzar durante o beijo, ao contrário de você.

— Bem, pelo menos isso quer dizer que a gente beija muito, mas saudades do gloss.

— Minha boca sem nada não é boa o suficiente?

Jungkook abriu a boca para oferecer uma resposta ofendida, apesar de saber ser só brincadeira. Porém, deu uma resposta melhor: uniu os lábios de Jimin aos dele. De novo. E, ao contrário do gloss, que a cada beijo se esvaía, a doçura natural era perene; nascida no jeito dos lábios encaixarem nos seus com tanto carinho, na predileção por selinhos, nos sorrisos que se esboçavam durante os beijos. E, apesar de todo o medo, Jungkook dormiu tranquilo, seguro de que seu doce estaria ali, mesmo depois de ter de encarar o amargor.

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Como sempre fazia quando queria conversar com sua mãe, quinta-feira Jungkook enviou um e-mail. Nem suava frio, suava congelado, ainda mais quando recebeu uma resposta positiva. Conversariam depois de sua volta da loja de conveniências e jantariam — de madrugada — na sexta-feira. A sexta que antecedia o sábado da competição de dança. De fato, havia adiado tudo ao máximo.

A mãe frisou que pediria comida, então sugeriu que não chegasse cheio. Jungkook se questionou sobre a escolha da comida, pois ela não sabia seus gostos. Não que desgostasse de muitas coisas, o questionamento apenas pairou em seu peito.

Apesar da resposta rápida, Jungkook continuava sentindo o coração marretar o peito, determinado em transformar em pó cada costela. Não dormiu muito bem, mas poderia jogar a culpa daquela noite mal dormida no trabalho até de madrugada na loja de conveniências.

No dia seguinte, Jimin passou o dia grudado em si, cheio de abraços, beijos e mãos dadas. Jungkook preencheu-se de carinho por ser objeto de tanta preocupação e cuidado.

Jimin sabia do jantar.

Jungkook notou cada detalhe da hesitação dele em ir embora da loja de conveniências, por mais rotineiro que fosse. As mãos mantinham-se tensas, em punho, fazendo as unhas longas marcarem a palma. Os pés não paravam quietos, mas colava as coxas às de Jungkook.

— Pode ir! — Jungkook riu, apenas por ter Jimin ao lado. Estava aterrorizado, então a risada só saía por achar Jimin adorável.

— Não quero te deixar sozinho...

— Infelizmente, não acho que seja uma boa estratégia você ir comigo jantar de madrugada com minha mãe. Além de eu não saber o que esperar dela, você taria no sétimo sono já — Jungkook consolou com um tom de humor. Jimin meneou a cabeça em concordância, apesar de relutante. — Além disso, você nunca me deixa sozinho.

— Bom que você saiba mesmo disso, gracinha! — Jimin encarou-o profundamente, entrelaçando os dedos debaixo do balcão. — Lembre-se de que estou aqui. Para qualquer coisa mesmo. Vou me manter acordado, esperando sua mensagem.

— Duvido!

— É, talvez não, mas espero que sim... — resmungou, com um biquinho nos lábios fartos. Pena estarem na loja, Jungkook queria tanto beijá-lo que era capaz de explodir.

Beijou, então, a bochecha macia e cheirosa, tão familiar ao toque. Sentiu, satisfeito, as mãos de Jimin subirem pelos seus braços até seu ombro em uma carícia. Quando findou o beijo, seu rosto foi segurado para que Jimin depositasse um de volta.

— Eu te amo tanto, gracinha...

— Também te amo, docinho. Mas você precisa ir, não precisa?

— Estou aqui para qualquer coisa...

— Eu sei, obrigado. — Dessa vez, Jungkook segurou a mão de Jimin para deixar um beijo nela. — Eu vou ficar bem aqui, você me ensinou. Talvez eu não fique bem depois do jantar da minha mãe, mas... aí eu corro pros seus braços que nem um bebê chorão.

— Fofo... — Jimin não pôde evitar uma risadinha, mesmo que melancólica. Era uma sensação estranha; um frio que engolia os pés e absorvia o estômago antes de se alojar no coração. Deixou mais um beijo na bochecha do namorado. — Boa noite então, gracinha, desejo que seja um ótimo jantar.

Jungkook concordou com um outro beijo e um sorriso fraco. Depois, observou o namorado atravessar a pesada porta de vidro, trocando a luz branca e abundante da loja pelos postes tímidos e amarelos da rua. De qualquer forma, continuava lindo, ainda mais dando uma olhadela ou outra para trás. Enfim, sobrou apenas o vazio ensurdecedor que preenchia o espaço deixado pelo sino da porta ao findar seu tilintar alegre.

Suspirou fundo. Nunca gostara de ficar sozinho ali, era seu calcanhar de Aquiles e o conhecia bem. Cruzou os braços no corpo, abraçando-se, enquanto inventava alguma maneira de se distrair até de madrugada. Até mesmo tocou um papel especial dobrado dentro de sua mochila. Queria ler a carta de Jimin, para ter uma presença dele, mas talvez fosse melhor guardar para a competição como orientado. Estaria ainda mais sozinho atrás das cortinas.

Por fim, foi estudar para a prova de geografia da semana seguinte e arrumou todas as prateleiras. Para sua alegria, meia-noite a loja de conveniências foi invadida por um grupo de cinco jovens que pareciam ter desistido de ficar em uma festa até o final.

Jungkook adorou esquentar água para os macarrões instantâneos deles e, depois de servir, ficar olhando para o teto enquanto ouvia todas as histórias detalhadas de como um sexto amigo ocupou-se demais seduzindo uma moça que claramente estava acompanhada da namorada e quase se meteu em briga. Queria perguntar por que ele não estava ali, se já tinham visto o desfecho da cantada indevida.

Enfim, foi uma distração muito divertida. As vozes tinham chegado pastosas por causa do álcool, mas até se recuperaram um pouco após dois copos de macarrão instantâneo para cada. Foram embora logo antes do horário de fechamento, então Jungkook passou o pano no chão e, enfim, fechou a loja.

Incapaz de adiar o inadiável e com medo de colocar um ponto final de tantas semanas de angústia, Jungkook se encolheu no casaco do uniforme e avançou pelas ruas mal iluminadas em direção à sua casa. Os passos eram rápidos e firmes, como se só pudesse confiar na inércia para impedi-lo de parar e sair correndo para a casa de Jimin.

Os passos rápidos só estancaram na porta da frente daquela maldita casa de bonecas. Dessa vez, a parte da frente estava iluminada, fazendo as pequenas palmeiras em vasos criarem sombras que Jungkook não saberia dizer ter gostado. Da fresta inferior da porta escorregava um feixe de luz preguiçoso, como se ele mesmo não soubesse até onde deveria ir, de tão desacostumado.

Abriu a porta, apesar de sentir muita relutância em fazê-lo. Não tinha alternativas. Fechou-a atrás de si com mais esforço ainda. Qualquer movimento era extremamente difícil.

Apesar de haver luz, o silêncio reinava e cada passo parecia fazer um eco dramático de filme de suspense. O terror que crescia em seu coração com cada um dos detalhes alimentava também a frustração. Se sua mãe fosse como Jina ou Bongcha, teriam risadas, conversas, barulhos de pratos e panelas e, quem sabe, até uma música preenchendo o local.

Quando chegou na porta da cozinha, encontrou a mãe idêntica à vez em que ela tinha tentado parar para conversar — e Jungkook fugira —: sentada, como um manequim; com os cabelos lisos sem um fio fora do lugar, como um desenho; a pele maquiada não deixava nenhuma imperfeição ser vista, como um boneco de cera. Em sua frente, na mesa, uma sacola de restaurante, dois pratos e dois conjuntos de talheres.

— Boa noite, filho — ela disse.

— Boa noite — ele respondeu. Se encolheu mais uma vez na jaqueta e foi pendurar a mochila em algum canto antes de se sentar à mesa, de frente para a mãe.

— Comprei frango ao molho de laranja, ouvi alguns clientes elogiarem no escritório. — A mulher inclinou-se em direção à sacola e serviu algumas embalagens. Tinha uma grande com o frango, uma com arroz, outra com algumas unidades de gyoza e, por fim, algo que parecia doce. — Você gosta?

— Sim. — Apesar de estar com fome, a náusea nervosa de Jungkook deixava-o sem vontade alguma de comer. Seu corpo se preparava para fugir: coração disparado, espinha suada, estômago comprimido.

Jungkook não fez nenhum movimento para pegar qualquer coisa, então sua mãe o serviu. Cada detalhe era estranho. A hesitação dela na quantidade de comida a colocar era perceptível, mas Jungkook nada falou. Depois, ela se serviu. Ficaram olhando um para o outro por um longo tempo.

— Não vai comer? — ela perguntou.

— Vou — ele respondeu, mesmo sem ter tanta certeza. Mas, de fato, não comeria antes da mãe. Então, completou: — E você?

— Vou...

Resignada, ela deu a primeira mordida. Jungkook o fez em seguida. Não era apenas náusea e receio que o fizeram aguardar, logo notou; era sua própria criação. Não fazia nada que pudesse ser interpretado de maneira negativa e como não entendia a lógica, valores e princípio dos pais, primeiro os assistia como um parâmetro do que e de como fazer sem piorar a situação.

Mastigou a comida. E, claro, seu primeiro pensamento foi que o frango com laranja feito por Bongcha e Jina era muito melhor. Era uma armadilha de seu cérebro: a comparação, a criação de expectativas; mas não conseguiu evitar.

— Está gostoso? — perguntou sua mãe. Jungkook concordou com a cabeça e ocupou a boca com o gyoza apenas para não precisar usar palavras. — Ah, esqueci das bebidas...

Ela se levantou, um pouco afoita, e o talher escorregou pelo prato e gerou um estampido antes de cair no vidro da mesa, marcando-o. Jungkook olhou com curiosidade a pequena chama de habitação marcada na mesa, em forma de sujeira. Depois, capturou a expressão da mãe, em uma careta. Alguns fios saíram do lugar. As mãos delicadas estavam no ar, sem saber como prosseguir. Ela pensou, pensou e foi atrás de um papel toalha. Ao limpar a mesa de vidro, mais espalhou o molho viscoso do que o limpou, mas se deu por satisfeita. Depois, respirou fundo, ajeitou os cabelos e foi até a geladeira pegar um suco de aparência requintada. Por fim, foi pegar os copos, abriu vários armários até achar o certo.

Com certo custo repousavam dois copos e um suco na mesa. Ela serviu o suco, quase derramando-o na mesa diversas vezes. Depois, empurrou um a Jungkook.

— Você gosta de suco de cranberry? — ela perguntou, afoita. Depois.

Jungkook assentiu com a cabeça. Nunca tinha tomado, para ser sincero, mas achava difícil desgostar de algum suco. Provou um gole e percebeu que era gostoso mesmo.

Nenhum deles saberia, mas aquela foi a última frase trocada durante o jantar. Comeram em um silêncio absoluto e assustador, como se cobertos por uma manta de vazio e escuridão, mesmo que estivesse tudo claro. Acostumado com a rotina da família Park, quando os pratos e embalagens já estavam vazias, Jungkook os recolheu, descartando o que precisava e lavando as louças. Odiou sentir o olhar da mãe pesar em suas costas.

E, mesmo sem nenhuma palavra trocada, Jungkook voltou a sentar à mesa. Ele e a mãe precisavam conversar. Lamentavelmente, todas as palavras pareciam presas em sua garganta. Tinha medo de cada uma delas. Tinha medo do passado, do presente e, mais que tudo, do futuro. Sentia-se um animal acuado. Enfiou a mão nos bolsos e, entre os dedos da mão direita, sentiu a superfície lisa do seu ajudante.

— Então, filho... Já decidiu se quer aceitar minha proposta? — A mãe quebrou os longos minutos de silêncio, e Jungkook, de certa forma, ficou agradecido por não precisar ser o primeiro a falar.

— Eu quero — Jungkook concordou com a voz baixa e vacilante. Mal saía. — Mas tem uma coisa que eu quero mais: fazer Faculdade de Dança. Imagino que, na sua proposta, você queria me apoiar em outro curso.

— Eu...

— É muito importante pra mim — Jungkook insistiu. Tinha medo de se quebrar em mil pedacinhos ao ouvir a resposta. Respirou fundo e, já tendo feito sua confissão, tirou do seu bolso o encarte da competição de dança e o estendeu a ela, que o pegou com certo receio, como se fosse mordê-la. Jungkook reuniu todas suas forças para encorpar a voz e falar: — Me inscrevi nessa competição pra tentar uma bolsa na faculdade que quero. O evento é aberto. Você pode ir? Pra eu mostrar que tô sério mesmo.

— Eu...

— Desculpa. — Jungkook a interrompeu de novo. A voz tinha perdido toda sua força, todo seu ímpeto. Fungou, amedrontado, e os olhos marejaram ao ver os alheios se arregalarem de surpresa. — Não sei se consigo dançar bem amanhã dependendo da resposta, mãe. Me desculpa, mesmo.

Foi o que ele disse antes de sair correndo da cozinha, temendo palavras mais do que qualquer bicho-papão. Seu peito pesou e ficou leve, ao mesmo tempo, quando alcançou a maçaneta da porta da frente. Atravessou-a afoito, deixando a resposta de Jeon Danbi no ar. Fugindo de novo.


Notas Finais


Bem, o Jungkook falou. E, sim! Próximo capítulo já é a competição de dança!

Ah, não se esquece de deixar seu votinho! 💜

Qual foi sua cena favorita? Acho que eu gosto muito das conversas dos jikook. Sempre que eu vou revisar, eu noto que talvez eu devesse cortá-las, pois nem todas dão elementos do enredo principal da história, mas elas me dão uma paz e conforto. Eles já falaram a maior parte dessas coisas? Sim. Mas acho que na vida real é assim, precisamos que algumas coisas sejam ditas várias vezes. Então, nunca corto nenhuma. Enfim, mais uma vez eu viajando na batatinha

Muito, muito, muito obrigada mesmo a todo mundo que lê, comenta, vota e dá tanto carinho pra minha bebê!! Vocês são meu ponto seguro como USFDB.

Como eu avisei na última postagem, vou entrar de férias de postagem em janeiro para aproveitar minha família, namorada e amigos durante as férias! Mas logo volto!

Desejo a vocês um ótimo 2023, muito obrigada mesmo por estarem comigo por esse ano, vocês o fizeram incrível!

Beijinhos de luz e até 11/02/2023 às 19:00! Amo vocês!


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