História Bring Me the Mermaids - New Perspectives

~Novas Perspectivas

Narradora

Existe poucas situações em que os marujos da frota de navios pirata Fairy Tail vivenciam o sentimento de medo. Muitas vezes sentido em tempestades, outras quando um navio real - regido por um capitão da frota do rei - passava próximo deles e eles têm que lutar, mas o medo não era sentido por todos obrigatoriamente, enquanto metade sentia a euforia em ter que lutar por sua vida, a outra metade sentia o pânico.

Mas em um único momento, todos os tripulantes sentiam medo ao mesmo tempo. Ninguém é capaz de falar, pensar ou até mesmo agir. Um passo errado e já é considerado morto, o que não é muito difícil de se conseguir quando o capitão, Natsu Dragneel, encara cada tripulante com um ódio absurdo.

Então não é muito difícil imaginar a vontade de todos os tripulantes de simplesmente pular daquele navio e fugir da morte lenta e dolorosa que o próprio capitão - se o indivíduo tivesse muito azar na vida, a vice capitã também - teria a satisfação de fazer em cada um.

O silêncio feito no cais é aterrorizante. As únicas pessoas que mantinham a cabeça erguida são Erza e Natsu, o restante não tinha coragem o suficiente de levantar a cabeça. O rosado encarava o loiro à sua frente com uma fúria jamais vista antes, Erza observava todos os marujos analisando os movimentos de cada marujo. Kana e Mirajane tinham conseguido se soltar dos marujos que as seguravam e, por estarem nervosas por não ter conseguido salvar sua mais nova amiga, deixaram as cabeças baixas e os olhos fechados.

- Eu fiz uma pergunta. - Natsu falou ainda olhando para os marujos. - Vocês vão me falar ou vão me obrigar a arrancar a língua de cada um de vocês? - O silêncio se fez novamente, afinal, quem era capaz de falar quando seu capitão está prestes a matar dolorosamente cada um dentro do navio?. - Olha Erza, eles querem que eu seja o vilão dessa história. - A ruiva soltou uma risada curta como resposta. - Venha até aqui Kana.

A morena se moveu em passos lentos, andando com seus olhos fechados e cabeça abaixada, suas mãos fortemente fechadas a ponto de se machucar. Parou ficando entre o seu capitão e líder.

- O que aconteceu aqui? - Kana mordeu seus lábios para não responder. - Por que você e Mira, principalmente Mira, estavam sendo seguradas por marujos? - A morena ainda olhava para baixo. - Olhe para mim quando falo com você.

Aos poucos a morena levantou a cabeça, passando as mãos nos olhos e logo após direcionou seu olhar para o capitão. Natsu ficou abismado no que viu, Kana Alberona, uma das tripulantes mais insensíveis do navio, estava ao ponto de chorar. Nem quando ela foi obrigada a ficar afastada de seu pai ela chorou, mas por uma sereia, uma insignificante sereia, ela foi capaz de soltar lágrimas? Natsu mudou o olhar para o loiro que está atrás da morena.

- Laxus olhe para mim. - O loiro relutantemente levantou a cabeça. - Olhe o que você fez com a Mira e com Kana. Veja o que você provocou. - O rosado andou até estar bem próximo de Laxus e colocou a mão no pescoço dele, apertando fortemente devido a raiva sentida. -  Achei que tinha dado ordens para você obedecer. Creio que já sabe as consequências. - Ficou em silêncio e depois soltou bruscamente o loiro para se virar para a tripulação - Vá buscar minha espada Erza, nós vamos matar um desordeiro.

- NÃO! - A sereia exclamou fazendo com que todos a olhasse. - Não... A... A culpa não é dele... Eu... Eu é que... Eu que provoquei, ele... Laxus não tem culpa de nada Natsu.

Erza Scallet

Surpreendente. Isso é tudo que eu tenho a dizer. Está mais do que claro que Laxus machucou a Heartfilia, ela não parou de chorar desde que pisamos no cais, de longe eu consigo ver ela tremendo de medo. Natsu olhava alternadamente para Laxus e para sereia, tenho certeza que está pensando se deve ou não matar o loiro.

Desde que sereia foi colocada aqui, a confusão reinou nesse lugar. Não teve um dia em que vivemos em paz, e piora quando o capitão deu a ordem de que ninguém poderia tocar na sereia a não ser ele. Quase todos os dias eu sou bombardeada com perguntas sobre um possível relacionamento entre Natsu e a sereia. É engraçado quando ouço esse tipo de coisa, digo, ele tratava ela muito mal e ainda trata mal, é uma coisa um pouco impossível de imaginar. Ainda mais quando eu sei que ele não vai criar sentimentos fortes por ninguém. Nem mesmo por Lisanna, que tem um relacionamento sexual com ele. Fico até feliz da albina não criar esperanças fortes.

Saí de perto de um marujo para chegar mais perto de Mira. Ela está chocada, não sei se é pelo o que a Heartfilia falou ou se é por que Natsu ter falado que vai matar ele. Sinceramente, esperava que Laxus tivesse, no mínimo, um pouco de inteligência no lugar que ele gosta de chamar de cabeça. Francamente, sabe que sereia é um "objeto privado" de Natsu e faz isso? Nem eu, que não tenho medo do rosado, tentei alguma coisa com ela.

Movi minha mão para tocar ela, mas antes que eu pudesse tocar em seu ombro, Mira bateu fortemente na minha mão. Me virei para ela confusa com sua ação e vi que ela me olhava mortalmente. Olhava para mim e para Natsu, o que era compreensível a raiva que ela sentia dele, mas não de mim.

- Sério? Sério que você vai tentar me consolar com esses pensamentos? - Eu olhava pra ela de forma perplexa, tudo que eu queria fazer era abraçar ela para que se sentisse bem. - Não venha com mentiras Erza. - Antes que eu pudesse falar alguma coisa, Mira estendeu a palma da mão na minha frente e completou: - Não, sério? Não venha falar comigo enquanto pensa dessa forma. - Falou andando para trás e olhando para mim com os olhos marejados. - Eu vou para o meu quarto. Lisanna, me conte o que aconteceu depois.

Mira saiu correndo para o interior do navio, atraindo o olhar de todos, e eu olhei para Natsu, que deu de ombros ao ver a reação de Mira. Voltou a olhar para Laxus e a Heartfilia. O rosado respirou fundo, andou até a loira - que se abraçou em modo de defesa - e ficou próximo ao rosto dela.

- Deixa eu ver se eu entendi. Laxus te machuca, te deixa nesse estado - Apontou com a mão para o corpo dela. - e tudo que você faz é proteger ele?

Olhei para o loiro e vi que estava tão surpreso quanto eu, achei que a Hearfilia soltaria exclamações de felicidade ou até mesmo um mínimo sorriso para toda a situação. O cara quase matou ela se nós dois não tivéssemos chegado, e ela resolve assumir a culpa do tratamento que recebeu? Não consigo descobrir o que passa pela cabeça dela.

Narradora

A Heartfilia assentiu com a cabeça fracamente enquanto manteve sua cabeça baixa. Natsu, por sua vez, estava ao ponto de explodir. Ele sabia que Laxus tinha feito alguma coisa, nos meses em que teve contato com a loira - mesmo sendo pouco - percebeu que não é qualquer pessoa que consegue simplesmente assustá-la. Nem mesmo Erza foi capaz de deixar a sereia com medo. E mesmo depois de ter sido capaz de mostrar que é, definitivamente e sem dúvidas, mais poderosa do que qualquer um naquele lugar, ela ainda era capaz de sentir medo de um simples humano. O que deixava a situação no mínimo confusa.

- Me diga três bons motivos para não matar você e o Laxus juntos. - Natsu falou friamente para a Heartfilia.

- Só eu posso te levar ao tesouro e as pistas, vai ter muita coisa atrás de sua tripulação a partir de agora e eu duvido que vai achar outro líder com as capacidades que Laxus tem. - A loira mergulhou na água para lavar seu rosto e logo após emergiu passando as mãos pelo cabelo. Sua expressão ainda demonstrava medo, mas agora era capaz de olhar firmemente para o rosado à sua frente. - Três bons motivos Dragneel. Não há motivos para matar nenhum de nós dois.

Natsu respirou fundo passando a mão no rosto e virou-se para a tripulação, estes, assustados com o movimento repentino, deram um passo para trás, se preparando para ouvir o pior aviso de morte que o capitão já deu. De fato, era inédito ver seu capitão estressado dessa forma, então quando acontecia, era mais do que certo que alguém iria morrer naquele lugar.

- Prestem bem atenção, se da próxima vez eu souber que alguém tocou nela, eu não vou ter a misericórdia de deixar alguém vivo. Estamos entendidos? - Os tripulantes gritaram em alto bom som que sim e Natsu se aproximou de Laxus, aproximando seu rosto do loiro falando ameaçadoramente: - Esse aviso vai principalmente para você Laxus, eu sei que você fez alguma coisa para ela ficar daquele jeito, sabe o que vai acontecer se isso se repetir.

O rosado saiu de perto do loiro e se dirigiu a cabine, precisava se acalmar e não seria ali no meio dos marujos que conseguiria isso, pelo contrário, tinha certeza que iria matar o Laxus e a sua tripulação, eles tinham tanta culpa quanto o loiro. O que mais irritava Natsu era o fato de ninguém ter ouvido a ordem de Mirajane para soltar ela, e pior, tiveram a audácia de usar força para segurá-la. Não era muito díficil ela se soltar, mas ele sabia que ela não estava mentalmente bem, então sua força física diminuiu consideravelmente.

Com a presença esmagadora longe do deck principal, os tripulantes começaram a pensar no que aconteceu antes de seu capitão dar as caras. Seu terceiro líder chegou durante a comemoração irritado por todos estarem agradecendo a sereia, ela é que tinha trago o perigo, estavam agradecendo por quê?

Se aproximou da loira, e não satisfeito por apenas ver o pavor nos olhos da sereia, começou a humilha-lá em palavras e fisicamente, a Heartfilia tinha recebido dois tapas antes que Mirajane e Kana interferissem. Mas elas não puderam fazer nada, com uma ordem do loiro, as duas foram seguradas por marujos, impedindo que pudessem fazer alguma coisa.

E por Laxus falar um pouco mais alto que o normal, rapidamente Natsu apareceu salvando a loira de uma possível morte. O que se tornou confuso foi a ação da loira para Laxus, ela deveria ter ficado feliz ao ter sido salva. E de fato ficou, mas ao olhar para Mirajane no momento em que o rosado anunciou que iria matar o loiro, ela tinha que fazer alguma coisa. 

Quando avistou o semblante de Mirajane, viu dor e o sofrimento dentro dela, e por mais que não tivesse criado um laço tão forte com a albina como criou com Kana, ela não queria que a albina sofresse mais do que já sofreu na vida, a perda de mais uma pessoa tão especial para Mirajane, acarretaria em um amontoado de sentimentos negativos. E isso era o que a Heartfilia mais queria evitar. Mesmo que tivesse que assumir a culpa e sofrer mais uma humilhação.

Aos poucos, os tripulantes começaram a se retirar do deck, sobrando apenas Kana, Laxus e Erza. A ruiva foi até o loiro, parou em frente à ele e o socou fortemente na barriga, Laxus, surpreso por ter recebido o golpe, caiu de joelhos sem ar abraçando sua barriga com ambos os braços para tentar aliviar a dor que sentiu. Erza puxou a gola do loiro, que encarou a ruiva com medo, ela está nervosa e ele, naquele momento, não podia fazer absolutamente nada.

- Mira está no quarto dela chorando - Apertou com mais força a gola da blusa -, você fez ela chorar com essa atitude de criança. - O soltou fazendo com que ele caísse no chão e usasse uma mão de apoio. - Parabéns Laxus, você acaba de perder a credibilidade que tem comigo. - E se retirou para seus aposentos.

Kana, que até então estava quieta, caminhou lentamente até chegar na sereia, as poucas lágrima que a morena deixava sair foram enxugadas pela Heartfilia, que sentia tristeza ao ver a amiga chorar. As mãos da loira pararam sobre o rosto da morena, acariciando com os dedões as bochechas molhadas e vermelhas por conta do choro. Lentamente, a Heartfilia foi se aproximando da morena querendo deixar suas cabeças encostadas.

- Eu estou bem Kana, não precisa chorar. - Juntou suas testas e fechou os olhos. - Tudo vai ficar bem. - Sussurrou e recebeu um abraço, surpresa pelo ato repentino, demorou alguns segundos para que pudesse corresponder o abraço sorrindo.

- Fico tão feliz que está bem loirinha, não sabia o que fazer se o capitão não tivesse chegado logo. - Apertou o abraço murmurando com a voz embargada. - Não tem ideia de como estou feliz por te ver bem.

As duas se mantiveram unidas até a loira dizer que precisava descansar, o dia sido muito pesado para ela, que precisava de uma trégua antes que começasse a pensar aonde iria levar Natsu e sua frota para um dos lugares prometidos. Pensou em ensinar Mira a sentir outros tipos de presenças, mas para isso, iriam precisar de muitas noites paradas e em silêncio no mesmo lugar, o que não arriscaria. Não depois de ter conversado com o vogel.

Não percebeu, no entanto, que Laxus começou a se aproximar dela. Seus olhos estavam fechados e ela se abraçava, se protegendo de tudo ao seu redor. Lágrimas saiam de seus olhos por se lembrar de cada palavra que foi ouvida a momentos antes, se perguntava se outros humanos seriam tão parecidos com Laxus.

Estava pronta para voltar para a água para finalmente descansar, quando duas batidas no tanque fizeram ela abrir os olhos. Abriu os olhos sorrindo, imaginando que seria Kana querendo conversar com ela, já tinha se acostumado com a morena aparecer três vezes na mesma noite, mesmo que já tivesse se despedido, apenas para jogar conversa fora. Logo que abriu os olhos, tomou um susto quando viu que não era ninguém menos que Laxus. A sereia rapidamente nadou até o outro lado do tanque, seus braços agarrados fortemente ao seu corpo, novas lágrimas eram formadas prontas para saírem, o que mais ele iria fazer com ela?

- Heartfilia... - Laxus falou baixo com sua cabeça abaixada. - Por que você me ajudou? Não te dei motivos para que pudesse fazer isso.

- Você... - Respondeu trêmula fazendo com que Laxus finalmente a olhasse. Engoliu em seco e respondeu. - Você é importante para Mirajane. - Respirou fundo. - E eu sei que ela não aguentaria te perder.

Esperava que com essa resposta, ela poderia voltar para a água e descansar até que fosse possível, até por que, com uma tripulação como aquela, pedir silêncio quando estavam prestes a chegar em terra, ainda mais vindo de uma sereia, é uma tarefa um tanto quanto complicada. Por isso se surpreendeu quando Laxus falou, em um tom relativamente baixo, um "obrigado".

Ainda em choque por ter recebido um agradecimento de Laxus - o arrogante líder da frota Fairy Tail - não percebeu que este foi embora deixando ela sozinha com as estrelas. Pensou em se beliscar para ter certeza de que esse momento realmente tinha acontecido, mas não queria ter uma marca duvidosa em seu corpo, se o loiro foi o último a se retirar do deck, então ele seria o culpado, mesmo que ela dissesse não mil vezes. Suspirou cansada e mergulhou na água para dormir.

[...]

Já tinha se passado uma semana desde o acontecimento crítico dentro do navio, o relacionamento antes receosos que os tripulantes tinham com a sereia, facilmente se tornaram amigáveis, ainda mais quando viram que ela abriu mão de sua vida e foi corajosa o suficiente para enfrentar o capitão Natsu nervoso-pronto-pra-matar Dragneel. Mesmo depois de ter sido tão humilhada daquela forma, o que eles não esperavam, foi a recepção que a sereia deu para eles, que foi mais do que satisfatória.

A Heartfilia simplesmente agia amavelmente com eles, parecia que o que tinha passado na última semana tivesse sido esquecido. O que eles não sabiam, é que a Heartfilia não conseguia esquecer do que sofreu nas mãos de Laxus. Depois do loiro, olhava diversas vezes para Erza, observando e analisando todos os seus movimentos.

Se Laxus, que aparentemente era considerado ainda o líder, tinha todo aquele poder no navio, Erza, que é a vice capitã, poderia muito bem mandar acabar com a vida dela com uma expressão no rosto. É claro, não aliviava mesmo sabendo que Natsu tinha dado aquela ordem, na verdade, a preocupava mais. Não era necessário força física para fazer com que a Heartfilia temesse um humano, esse tipo de força era algo indiferente para ela, o que a mais machucava eram as palavras, e isso ela sabia que todos ali usavam muito bem.

Erza, curiosa por estar sendo bastante observada pela Heartfilia, saiu do deck superior e andou até onde a loira se encontra. A sereia, que estava olhando os tripulantes trabalharem arduamente, tomou um susto quando, ao virar a cabeça para a frente, se deparou com a ruiva olhando com o cenho franzido. Certo, outra que poderia atormentar muito bem a vida dela. 

- Acho que não nos apresentamos direito. - A voz severa acompanhada de um sorriso amigável, chocou os tripulantes que estavam em volta delas e a própria Heartfilia. - Vice capitã, segunda no poder total dentro da Fairy Tail, primeira mulher a conseguir manejar diversas armas em mãos, nome proibido dentro de cidades reais, a mulher mais temida do mundo, Erza Scallet. - Terminou a frase curvando-se um pouco para a sereia. - E você é? - Perguntou já levantada com um sorriso no rosto e com as mãos juntas atrás do tronco.

- Sou a Hearfilia que vocês tanto me chamam. - Respondeu com um sorriso divertido. - Única sereia lendária existente, quarta no poder entre os seres, crucial na vida de vocês. - Finalizou com os cotovelos apoiados na borda do tanque enquanto seu rosto sorridente era apoiado por suas mãos que se mantinham fechadas.

- Única lendária? - Perguntou com uma sobrancelha levantada.

- Sim. É verdade que existem outras sereias extremamente poderosas, clãs que tem seus segredos de ataque, mas - Falou mais alto para enfatizar. - eu sou a única sereia lendária. Por quê? Não pareço lendária?

- Nem um pouco. - Respondeu rapidamente fazendo com que a Heartfilia a olhasse descrente pela resposta e logo tratou de explicar. - Digo, você é bem forte e quando a capturamos, parecia ser uma mera sereia. Não esperávamos que pudesse fazer tudo aquilo, mesmo sendo uma Heartfilia.

- É... Bem... É que... - Suspirou desistente tentando explicar, provocando uma risada na ruiva.

- Não me parece que gosta do sobrenome que carrega Heartfilia. - Comentou brincando.

- E não gosto mesmo. - A loira disse com os braços cruzados e olhos fechados. - Como você gostaria de viver sabendo que a todo momento, todos os seus passos, toda sua história pode muito bem ser esquecida como um passe mágica? - Não esperando pela resposta, continuou: - Eu já... Cansei de me perguntar se o que estou fazendo, eu já não fiz uma primeira vez. - Disse com os braços soltos enquanto encara o céu azul com poucas nuvens.

- E como você sabe que esqueceu tudo o que fez? - Erza perguntou logo depois.

- Porque eu não sabia o meu nome até alguém me chamar assim, e eu não estava com um corpo de uma sereia criança. - Apoiou as mãos na borda com os braços esticados. - Mas, isso é uma coisa que você, humana assustadora mesmo sendo linda, nunca irá saber.

A ruiva, se surpreendendo pelo elogio assim que o captou, ficou rubra. Eram raras as vezes em que recebia um elogio sincero, então não soube muito o que fazer quando ouviu. O máximo que se permitiu foi abaixar a cabeça e assentir, como um agradecimento silencioso. 

- Oooh! Mirajane! - Exclamou a loira. - Que bom que está aqui! Estava com saudades de você. - Disse olhando carinhosamente para a albina.

Virando o corpo para trás enquanto levantava a cabeça, Erza notou que Mirajane vinha até elas andando em passos calmos e com um sorriso no rosto. A albina está usando a mesma roupa preta de sempre, os cabelos longos brancos soltos com apenas a franja presa, seus braços atrás de seu corpo, com ambas as mãos entrelaçadas.

Assim que chegou próximo as duas, se aproximou um pouco mais da Heartfilia e deixou com que a loira encostasse suas testas. O sorriso no rosto não deixou de sair. Os que passavam em volta delas encaravam a cena confusos, afinal, o que diabos aquelas duas estavam fazendo? Não demorou muito para que Kana surgisse do lado de Erza, assustando a ruiva, e olhasse a cena com um misto de ciúmes e divertimento.

- Mira-chaaan, por acaso está roubando minha amiga? - Falou interrompendo o carinho feito por Mirajane e a sereia. - E que isso loira? Achei que fazia isso só comigo!

- Ciúmes por que ela me abraça mais que você é? - Mirajane provocou olhando para a morena enquanto fazia com que a Heartfilia a abraçasse por trás por cima dos ombros.

- Ahaaam, claro, com certeza. - Disse enquanto revirava os olhos. - Mira-chan, se você não acordar amanhã, já sabe o motivo. - Com uma falsa ameaça, as duas se puseram a rir e logo encararam Erza, confusa pelas duas estarem "brigando" pela sereia.

- O que foi Erza? - Mira perguntou ainda rindo.

- Nada, só estou.... Confusa. É, essa é a palavra. - A albina levantou uma sobrancelha e a ruiva completou: - Não sei o motivo de vocês duas agirem assim, eu vejo claramente a diferença nas relações entre vocês três. - Iria completar que não entendia o motivo de elas agirem assim com um ser que podia a qualquer momento, mas decidiu nem falar, poderia acarretar em uma briga nada bonita.

- A Kana tem mais amizade com ela, desde que a gente esteve com o Gilin ela tem falado com a Heartfilia, eu só depois de quase surtar. Mas, eu tenho a consciência de que Kana sabe de algo que ninguém aqui sabe.

- E como tem certeza disso? - Erza perguntou olhando seriamente para a albina.

- Porque eu consigo ler a mente das pessoas. - Respondeu como se fosse óbvio.

Kana apenas sorria, confirmando a teoria delas. De fato, ela sabia o que todos dentro daquele navio queriam saber, ela sabia o que poderia causar um sofrimento maior a sereia, e por conta de ter criado um laço afetivo com a loira, não é capaz de simplesmente sair espalhando por ai qual é o nome de sua amiga. Mesmo que isso acabasse na morte dela. Se a sereia confia nela ao ponto de ter falado o bem mais importante para ela, então Kana não teria coragem de quebrar essa confiança.

[...]

A noite, pela primeira vez nas semanas em que estava no navio, a Heartfilia ficou sozinha no deck. Não tinha um marujo vigiando ela ou perambulando pelo navio, nem Kana apareceu para conversar com ela, o que era no mínimo estranho, já que todas as noites a morena aparecia carregando uma garrafa de bebida e passava a metade da madrugada conversando com a loira.

Suas noites se tornaram divertidas com a morena, Kana tinha uma curiosidade engraçada, sempre estava perguntando para ela sobre o modo de vida que ela tinha antes; quais eram os poderes que ela tem; a história dela até aquele momento; perguntava tudo. Obviamente a Heartfilia respondia apenas algumas perguntas, mesmo que Kana fosse uma humana que com quem tem laços afetivos, ela não tinha permissão para falar o que queria e para ajudar, sabia que tinha além de dois marujos ouvindo a conversa que tinha com ela.

A sereia não é tão ingênua ao ponto de falar pelos cotovelos como Kana e seus quatro observadores queriam que falasse. O que a deixava nervosa, porque ela realmente queria responder as perguntas da morena, mesmo não tendo permissão, mas com os dois marujos vigiando ela juntamente com os dois que ouviam a conversa atentamente enquanto estavam escondidos, se fazia impossível querer falar alguma coisa.

Mas nessa noite, incrivelmente, ela conseguiu ficar sozinha no deck. Não sabia se isso tinha dedo do destino ou, pensando de maneira mais real e fria, Natsu mandou que todos deixassem o deck e fossem fazer sabe-se lá o que pelo navio. Esperava que Kana não aparecesse ali e a chamasse pelo nome, tinha a leve impressão que alguém poderia escutar, e isso acarretaria em problemas para a morena e a loira.

Porém, se surpreendeu quando, em vez de aparecer como de costume a morena, Natsu Dragneel saiu de sua cabine e andou em direção à ela. Isso estava confuso, estava para além de estranho. O que ele veio falar com ela? Mais cedo conversou um pouco com Erza, perguntando sobre a próxima terra em que iriam visitar. O que rendeu a uma boa parte da conversa regida pela Alberona, animada para beber mais que já bebe normalmente. Supunha que ele já tinha uma noção do que as quatro conversaram. Então o ele veio fazer aqui?

O rosado parou em frente à ela com uma expressão fria e vazia, boa coisa não iria vim dele, tinha absoluta certeza disso. Por não saber o que se passa pela cabeça do rosado à sua frente, a loira tinha a impressão de que ele mandou esvaziar o deck para ficar com ela sozinho. E isso a assustava. Veja bem: no primeiro dia em que estava no navio, foi extremamente humilhada - não mais do que passou com Laxus -; toda vez que ele ia falar com ela, falava de uma forma grosseira e imperativa; a forma como ele olhava para ela fazia ela se questionar se tinha alguma coisa de errada com o corpo dela, e pior, a fazia se sentir mal e por fim, Natsu Dragneel nunca dirigiu a palavra para ela de forma amigável, o tom mais "carinhoso" que ele usou com ela, foi há uma semana, quando ela sofreu nas mãos do loiro. Apenas.

O simples ato dele sair da cabine, andar até ela e ficar encarando-a  como se fosse uma presa prestes a ser morta, fazia a sereia ter sentimentos de arrependimento por não ter fugido antes quando tinha chances. O silêncio, presente desde o momento em que saiu de sua cabine, não era nada confortável, e não ajudava quando a Heartfilia encarava qualquer outro ponto menos o rosado à sua frente.

- Como é que você olha para todo mundo nos olhos e evita de olhar diretamente para mim? - Natsu falou fazendo com que a loira, finalmente!, olhasse para ele em dúvida. - Ah viu, não é tão difícil. - Disse com um sorriso. 

A Heartfilia arqueou uma sobrancelha confusa. Natsu Dragneel, o capitão arrogante-babaca-que-vive-nervoso acabou de sorrir para ela. Isso estava ficando cada vez mais assustador.

- Pensei que tinha dito antes que te odiava, o que você tá fazendo aqui? - Perguntou analisando o comportamento dele. - Sabe, prefiro a companhia dos dois humanos ao meu lado do que você.

- Obrigado, fico feliz de saber que em seu pequeno mundo, eu sou um mero mortal. - Disse sarcasticamente. - Eu sou uma pessoa importante, sabia disso Heartfilia? - A loira deu de ombros, isso não importava para ela. - Posso mandar qualquer pessoa acabar com você.

- Dragneel, eu sei disso desde em que você me colocou nesse tanque ridículo, mas acho que você tem uma autoimagem muito alta. - Retrucou sorrindo. - Você é um mero mortal perante a mim, homem cujas ambições vão levar à algo pior que a morte, um homem simples e insignificante. - Percebeu que o rosado ficou nervoso diante da resposta. - Não venha ficar zangado comigo, eu tenho sou anos mais velha que você Dragneel.

- Heh, então eu deveria tratar você como eu trato uma velha? - Com uma sobrancelha levantada e um sorriso cínico no rosto completou: - Sabe, para um monstro, você se dá bem com as palavras. - Provocou.

Fazia muitas noites que ele não a chamava de monstro, a sereia tinha ficado até aliviada que por ele não ser a pessoa que chama, afinal, aos poucos, mesmo de forma bruta, um laço começou a ser criado com ele, coisa que jamais admitiria. E agora, como um passe de mágica, tudo foi quebrado.

- Dragneel, se eu fosse você, tomava mais cuidado com as palavras. - A Heartfilia respondeu com a cabeça abaixada e a voz baixa. - Uma hora ela vai se voltar contra você.

- Isso é uma ameaça? Você, uma sereia, está fazendo uma ameça? - Perguntou sério. Sua mão instintivamente foi para o cabo da espada.

- Sim, eu, uma sereia. - Levantou a cabeça e Natsu apertou a força no cabo, os olhos dela estavam dourados, um sinal de perigo. - Precisa tomar cuidado Dragneel, eu não quero mostrar para você o que significa irritar uma Heartfilia. - Ambos se olhavam, ameaçando pelo olhar e analisando o próximo movimento que um poderia fazer, mas para evitar uma briga perigosa, a Heartfilia fechou os olhos e logo quando abriu, seus olhos já tinham voltado a coloração castanha. - Para que veio aqui Dragneel? Ter uma conversa amigável comigo que não é.

- Na verdade, eu vim tentar ter uma conversa amigável com você, mas parece que é impossível. - Explicou olhando para seus pés. - Sei que Erza, Mira e Kana gostam bastante de ficar batendo papo com você, ouvi a conversa hoje a tarde.

- E todas as noites né? - Perguntou retoricamente, o que fez com que Natsu levantasse a cabeça e a encarasse surpreso. - Eu sei que você e Erza tem ficado até de madrugada ouvindo minha conversa com Kana. Sabe Natsu, se quiser perguntar alguma coisa para mim, pergunte, mas não escute uma conversa íntima entre mim e Kana. E está errado Dragneel, eu conversei com Erza apenas hoje, as únicas pessoas com quem converso diariamente é Mirajane e Kana.

Mais uma vez o silêncio foi feito entre eles. Não existia muita coisa que Natsu poderia falar para a Heartfilia, não tinha motivos e não pretendia ter uma amizade com a loira, queria obter informações e pensou que por acaso fosse uma pessoa gentil com a sereia, conseguiria. Mas não pareceu ser um plano muito inteligente, sabendo que a sereia compartilhava os mesmos sentimentos que tinha por ela.

- E então? O que tem a perguntar? - A Heartfilia perguntou incomodada com o silêncio, se pudesse escolher entre o silêncio sozinha no deck e o silêncio assustador com o rosado, preferia mil vezes a primeira opção, mais confortável e mais agradável.

- O que Kana sabe que ninguém mais sabe? - Direto. Precisou de alguns segundos para que a Heartfilia entendesse o que Natsu perguntou.

- Não posso responder.

- Por quê?

- Se eu responder, você irá atrás dela, e isso vai se tornar um problema. Não, você não vai saber. - Negou vendo que ele iria abrir a boca novamente.

- Certo, não vou saber. - Isso surpreendeu a Heartfilia. - O que foi? Eu sei perceber quando não tem como eu ter o que eu quero. - A Heartfilia franziu o cenho.

- Até parece Dragneel, você é mais teimoso que um peixe quando tenta nadar contra a corrente do mar. Estou te falando a semanas que não tem como você obter o tesouro e ainda insiste nisso. - Finalizou com os braços cruzados.

- Mas eu sei que vou conseguir obter o tesouro.

- Ah claro, só vai, não sei, ter sua alma agarrada por alguma coisa e ficar rodando pelo mundo atrás do seu precioso tesouro. - A Heartfilia passou a mão em sua testa e olhou para Natsu cansada. - Olha Dragneel, eu tive a semana cansativa, e hoje foi o único dia em que pude relaxar, e você, como um humano impertinente, está acabando com a minha noite, será que pode ir embora?

- Não. - Negou balançando a cabeça, a sereia suspirou, ele é sim muito teimoso. - Eu também quero saber o que Laxus fez com você.

Bastou que falasse isso que o corpo da Heartfilia ficasse travado. Aquele dia era um dia que não gostaria de lembrar. A sereia tinha o costume de deixar o que a deixou traumatizada em um canto da mente dele em que nunca pudesse lembrar, para que assim pudesse passar os dias felizes e não visse problema em olhar para o céu estrelado a noite sem pensar em coisas negativas.

O que ela passou há uma semana, foi rapidamente colocado nessa gaveta e ela esperava nunca ter que abrir aquela gaveta, seu corpo não estava preparado para aquilo e sabia muito bem que, se por acaso aquele dia passasse pela mente dela, seria um choro sem fim.

E agora, um rosado curioso demais para seu gosto, tinha acabado de pedir para que ela falasse uma de suas memórias traumáticas. Ela não poderia fazer isso, e por isso, negou veemente o pedido dele. Não, ela não falaria. Mesmo que ele tentasse ameaçar ela, a sereia não relembraria aquele dia.

- Não vai mesmo falar né?

- Natsu, não foi você que ouviu as coisas horríveis, não venha me obrigar a dizer uma coisa que eu sei que vai me deixar vulnerável. - A cabeça da loira estava abaixada e ela se abraçava. O Dragneel percebendo que não iria conseguir arrancar absolutamente nada dela, suspirou.

- Heartfilia. - A chamou fazendo que a sereia olhasse para ele. - Não importa quantas pessoas venham falar que vão te matar, eu sempre vou estar aqui para proteger você. - Disse com uma seriedade jamais vista surpreendendo a sereia. - Afinal, você é uma peça importante para conseguir o que quero. - Finalizou rendendo uma risada seca provinda da Heartfilia.

- Fico feliz em saber que sou o que mais importa para você no momento.

Os dois olhares se cruzaram, sentimentos opostos eram mostrados, enquando a loira olhava para o rosado friamente, este a olhava sério, comprovando que a confissão feita antes é importante e que ele trataria de cumprir. Se encaravam sem saber o que dizer, Natsu deixou bem claro que só iria defendê-la por conta do tesouro, mas, uma pequena parte da Heartfilia, uma parte que jurou nunca aceitar e deixar escondida e que iria reprimir de todas as formas, sentiu desapontamento por ter sido comparada a uma mera peça de jogo.

Afinal, Natsu Dragneel não era tão diferente dele afinal.