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História Essência da Verdade - O elemento que é o tudo


Escrita por: Laisve e MorganaLFay

Capítulo 16 - O elemento que é o tudo


Fanfic / Fanfiction Essência da Verdade - O elemento que é o tudo

 

Acordou com o som estridente da música que havia colocado em seu celular para despertar.

Costumava programar o aparelho para tocar música clássica, mas o som aumentava seu estado de relaxamento e por vezes não surtia o efeito necessário.

Descobriu a tal música através de Isaak, ele parecia gostar de um estilo rock mais pesado e em um dia qualquer, enquanto trocava de roupa no quarto de funcionários do Imperador, o outro garçom entrou munido de seus fones e com o volume da música tão alto, que o som escapava por eles. Depois de um tempo, Isaak guardou suas coisas e Sorento não conteve a curiosidade de perguntar o que ele ouvia. Ao contrário do que esperava, a resposta veio tranquila e sem nenhum tipo de sarcasmo. Ele inclusive se ofereceu para apresentar novas músicas, do mesmo estilo. Mesmo estranhando a cortesia, Sorento agradeceu e gravou o nome da música. 

Isaak era uma pessoa difícil de entender, e sendo muito sincero consigo mesmo, não estava no melhor momento para tentar desbravar a mente tortuosa e primal daquele garoto. 

O que menos precisava nesse momento, era de mais problema, drama e incerteza.

Ainda sonolento, pegou o aparelho na mesa de cabeceira e desligou a música.

Olhou o relógio e soltou um muxoxo de irritação. Eu só queria dormir…  Pensou cansado, sentindo no corpo o peso dos intermináveis dias de trabalho. Olhou a tela do celular mais uma vez, verificando que era domingo. 

Ao menos hoje não precisava ir ao Imperador. O sábado já tinha sido estressante o suficiente, e mais uma vez, tinha que admitir que quando queria Isaak conseguia ser uma pessoa amável… Talvez amável fosse exagero. Mas ele era no mínimo gentil. De qualquer modo, divagações sobre o colega de trabalho não pagariam seu aluguel e muito menos suas contas, sendo assim, o melhor que poderia fazer era levantar logo. 

Levantou da cama e ficou ainda alguns minutos sentado olhando para o nada. Teve a impressão de ter ouvido alguns sons na casa, mas podia ser sua mente cansada pregando uma peça. Dando um longo suspiro, levantou e seguiu para o banheiro. Tomou um banho gelado, contando que a água causasse desconforto suficiente para espantar o sono, e se assustou ao perceber que poderia dormir em pé no banheiro caso não se policiasse. Saiu do banho, enrolou uma toalha na cintura e escovou os dentes. 

Suspirou ao olhar seu reflexo no espelho. 

Não possuía mais o rosto de um herdeiro, alguma coisa havia se perdido ali, mas gostava muito mais do olhar cansado que carregava agora, o que soava incrivelmente irônico até para ele mesmo. Saiu do banheiro assim que terminou de escovar os dentes e pendurou a toalha. Vestiu uma calça preta e uma blusa social rosa clara, que havia ganhado de presente de Shun. Dobrou as mangas da blusa, arrumou sua cama, pegou sua bolsa carteiro e saiu do quarto. Fechou a porta de seu esconderijo, seu quase pilar de sustentação e seguiu para a cozinha. Conforme se aproximava conseguia identificar a voz macia e gentil de Shun e os resmungos de Ikki. Sorriu sem perceber. 

— Bom dia, Sorento! — Shun falou animado fritando alguns ovos.

— Bom dia, Shun… — Sorriu para o rapaz — Ikki… — Meneou a cabeça e sentou ao lado dele.

Ikki correspondeu o comprimento e sorriu de leve. Sorento conteve o sobressalto, era tão raro ver Ikki sequer esboçando um sorriso que ficou surpreso. Provavelmente, ele tinha passado a noite com Pandora e estava de muito bom humor. Na verdade, todos ali pareciam estar animados. E ele sabia identificar muito bem o motivo de toda a agitação. Sexo. 

— Hoje vai para a livraria, né? — Shun questionou colocando um prato em frente a Ikki que olhava o celular desinteressado.

— Sim… Ao menos saio cedo, vou conseguir dormir um pouco. 

— Você tinha que fazer alguma coisa para se divertir. — Ikki falou enquanto parecia procurar algo no telefone.

Sorento levantou uma sobrancelha confuso. Desde quando Ikki se preocupava com sua vida? Além de Shun, não sabia haver nada nessa vida que prendesse a atenção do rapaz de compleição séria e cabelos escuros. Ao que tudo indicava, nem mesmo Pandora, a namorada com quem ele vivia agarrado, era tão bem quista. 

— E você tem alguma sugestão, Ikki? — Sorento questionou bebendo um copo de café servido por Shun. 

— Sugestão eu tenho várias. — Ikki levantou os olhos do celular — Mas, acho que você sabe do que precisa. 

Sustentaram o olhar por algum tempo até que Sorento soltou uma sonora e divertida gargalhada, Ikki voltou a olhar para o celular contendo o riso e Shun observava a cena sem entender muito bem, mas genuinamente feliz pelo ambiente familiar. 

— Você tem razão Ikki, eu sei do que preciso. 

— Ótimo! Não acho que terá problemas com isso. Irmão, já estou indo. Vou passar a noite na casa da Pandora. — falou um tanto sério — Talvez volte amanhã.

— Ok… Se cuida. Manda um beijo para Pandora. 

Ikki deu um sorriso sacana que passou despercebido por Shun, mas que foi acompanhado por Sorento. Olhou da forma mais discreta possível para o irmão do senhorio e pensou: Pena que é hétero… Uma lástima mesmo… Tão gostoso! É… Eu preciso transar. 

Ikki era um homem extremamente bonito e atraente, infelizmente não tinha os mesmos interesses que Sorento. 

Contudo, nunca demonstrou nenhum tipo de aversão ou desconforto com a orientação do flautista. O que poderia causar estranheza devido a postura de macho alfa que o outro ostentava. Sabia ser só tipo, mas na primeira vez em que viu o irmão de Shun, achou que iria rememorar toda a humilhação e tristeza pela qual havia passado em sua antiga casa. Às vezes o destino trás grandes surpresas! 

— E você vai ficar em casa hoje, Shun? 

— Vou sim. A June vai vir para cá. Vamos ver uns filmes… Ela anda bem cansada por causa do trabalho. Parece que aquela empresa não tem muita preocupação com horários e afins… Fico preocupado. 

— Entendo. É engraçado ver um futuro médico falando sobre horários. — Sorriu.

— No meu caso foi escolha, no dela é só falta de organização da tal empresa mesmo. 

— Nesse caso, faça sua namorada relaxar e aproveite a tarde. Devo chegar lá pelas 16h30 ou depois. — Levantou da mesa. 

Sorento recolheu o prato e a xícara que havia usado e fez menção de lavar a louça no que foi impedido. Agradeceu e já estava na porta calçando os sapatos, quando recebeu um pacote de biscoito amanteigado das mãos de Shun.

— Assim você come alguma coisa na hora do seu intervalo. Você quase não come Sorento. Depois vai ficar doente. 

Sorento guardou o pacote de biscoitos nitidamente feliz, não lembrava de alguém já ter realmente se preocupado com ele. A família nem sempre possui a mesma carga genética que a nossa. 

— Obrigado, Shun. Vou comer sim. Pode ficar tranquilo. Até breve…

— Até… E Sorento… Ficou ótima a camisa. 

Despediram-se com um sorriso. Sorento começou sua caminhada em direção ao metrô bendizendo a sorte que teve depois de todos os problemas que havia passado. Ao que parece, realmente existiam males que vinham para o bem.

 

***

 

Abriu os olhos e percebeu que o sono não havia em nada restaurado suas forças. Dormiu segurando o aparelho celular, no visor uma das fotos que olhou a exaustão, buscando o conforto, mas terminando por se entregar ao prazer solitário ao imaginar que poderiam estar juntos. Olhou seu estado geral e se sentiu deplorável. 

O aparelho apitava indicando o status da bateria. Fazendo um esforço sobre-humano  levantou e plugou o celular no carregador, percebendo que já passava do meio dia. Não costumava dormir tanto assim, nem mesmo quando bebia. O que de certa forma não fazia tanta diferença pra ele, já que possuía uma tolerância a bebida que faria inveja em qualquer deus nórdico. 

Puxou os lençóis da cama com certo desgosto e jogou tudo no cesto de roupa suja. Entrou no banheiro mais sério que o de costume, prendeu os fios ruivos em um coque alto e adentrou o box. O corpo já estava desnudo, a roupa manchada de sua própria vergonha, estava embolada nos lençóis que havia colocado para lavar. 

Deixou a água cair por seu corpo, não era um fã de banhos quentes, o que sempre o fazia lembrar de Milo, que parecia querer escalpelar a pele toda vez que se banhava. Sorriu de leve, diminuindo a temperatura do chuveiro. Era mais afeito a água em temperatura natural, por assim dizer. O banho foi rápido, apenas para limpar o corpo e clarear os pensamentos. Infelizmente a academia estaria fechada, mesmo que aquele não fosse o horário que considerasse ideal, tinha consciência de que precisava extravasar sua inquietação de alguma forma. 

Em outros momentos, certamente sairia para caçar e resolveria momentaneamente sua ânsia de companhia e calor, agora, mesmo que de forma embaçada conseguia entender que precisava de algo mais duradouro. Encontros de uma noite não seriam mais a sua solução. Abriu a cortina do quarto e viu que o dia estava nublado. Sendo assim, poderia aproveitar para fazer uma corrida, sentir o vento no rosto, enquanto desbravava alguns quarteirões não parecia uma má ideia. 

Vestiu um dos shorts que costumava usar na academia, uma camiseta e manteve o coque. Olhou o celular e o aparelho possuía carga suficiente para tocar algumas músicas. 

Saiu de casa em jejum, no caminho de volta poderia comer alguma coisa. Chegou na entrada do prédio e trancou o portão, colocou os fones de ouvido e iniciou a corrida.

Imprimia um ritmo rápido com o intuito de esquecer os últimos dias, quem sabe até os últimos anos. Precisava conter a vontade excruciante de ligar para ele e esclarecer tudo. Explicar suas atitudes e pedir perdão. E acima de tudo, despejar tudo que estava guardando durante esse tempo. Mas sabia que jamais poderia fazer isso, ele estava feliz e não ia estragar aquilo. Já que ele não pôde trazer felicidade ao outro, não era espírito de porco o suficiente para estragar o que estava sendo construído. Mais do que isso, ainda não estava bem o suficiente para se julgar merecedor de confiança. Já traíra as expectativas dele por mais de uma vez, não queria fazer de novo.

No mais, precisava continuar seu tratamento.

Não via a hora do domingo acabar e conseguir conversar com seu terapeuta. Achou graça ao notar que agora sentia necessidade das sessões que antes o causavam tédio e enfado. 

Correu até sentir o ar faltar aos pulmões, e respirou o ar fresco, quase gelado daquele dia. Era hora de voltar. Continuava inquieto, uma sensação de vazio, mas não adiantaria passar o resto do dia correndo. Voltou pra casa caminhando, tentando se distrair com a paisagem local e ouvindo uma playlist mais relaxante.

Cortesia de Milo, da época em que ainda namoravam e o grego gostava de organizar as músicas do celular do ruivo. O namoro acabou, mas Camus não mexeu na organização, não havia motivo pra isso. Admitia que era muito bem feita.

Tomou café em uma padaria próxima a sua casa e subiu para seu apartamento com um saco de pão e o restante do café em um copo. Colocou as coisas na cozinha e ligou o celular no carregador mais uma vez. O relógio marcava uma e meia. Não havia passado tanto tempo quanto gostaria. 

Suspirou cansado.

Estava exausto de se sentir perdido e acima de tudo só. Ao menos no dia seguinte poderia ocupar sua mente com o trabalho e com voz irritante e macia de Shaka perguntando sobre os relatórios dos medicamentos. Não conseguia se ver livre do amigo nem no trabalho, já que ambos eram farmacêuticos na mesma indústria. Pelo menos posso perguntar o que ele achou do livro. Camus pensou sentindo um estalo em sua mente. Tinha uma vaga ideia do que poderia fazer para ocupar o resto da tarde. Era arriscado e talvez não desse em nada, mas ao menos parecia seguro o suficiente para todos os envolvidos. 

 

***

 

Caso acreditasse em algum tipo de divindade, Sorento estaria agradecendo a ela nesse momento e prometendo todas as ofertas e oferendas possíveis. O dia tinha sido incrivelmente tranquilo e pacato. E era disso que ele precisava nesse momento.

Passou o dia bocejando e organizando a bagunça que tinha sido deixada pela equipe anterior, para sua felicidade os poucos clientes que o abordaram eram de uma educação e simpatia ímpar, e não pediram nada absurdo. Alguns só queriam dicas de livros e estavam abertos as mais variadas sugestões, e outros só queriam saber se o título que buscavam constava naquela loja.

Todos os dias podiam ser assim. Pensou enquanto entregava um volume de “Contos de horror do século XIX”, a uma cliente. 

O dia seguia tão tranquilo que passou a acreditar que em algum momento algo terrível iria acontecer, não era comum passar um dia de trabalho incólume. Já tinha adquirido experiência suficiente no trato com o público, para saber que probabilidade de um dia sem imprevistos era quase nula. 

Contrariando suas previsões funestas o dia seguiu em relativa paz, conversou com os colegas de trabalho, com Mime em especial, outro musicista que estava naquela loja para complementar a renda. 

Organizou os livros, verificou algumas fichas de clientes que haviam feito encomendas com ele e tirou seus quinze minutos de intervalo quando notou o movimento quase inexistente na loja.

Subiu para a copa e pegou uma xícara em seu armário, lembrando dos biscoitos que havia recebido de Shun. Abriu a bolsa sorrindo e retirou o pacote dali. Entrou na copa e encheu a xícara de café, abrindo a embalagem e comendo um dos biscoitos. Nossa… São realmente bons. Valeu, Shun! 

Um sorriso divertido ornava seu rosto ao lembrar da gentileza do amigo. Sim, Shun não era apenas seu senhorio, havia se tornado seu amigo, um dos melhores que poderia ter encontrado em seu caminho. Até mesmo de Ikki não podia se queixar, por mais que não fosse tão presente, sabia que podia contar com ele, assim como contava com Shun. Pensando em Ikki, lembrou da animação dele e do irmão mais novo durante o café, e da insinuação bem acertada do moreno. Ikki era observador e Sorento nunca tinha levado ninguém para casa, por mais que ambos já tivessem deixado claro que não haveria problema nenhum nisso. A casa também era dele. Mesmo que na prática não fosse, na teoria Shun fazia questão que o flautista se sentisse como parte daquela família. E ele conseguia. 

Tirou o celular do bolso do colete e ficou olhando para a tela do aparelho. Mordeu mais um biscoito e desbloqueou o telefone. Mexeu durante alguns segundos no celular buscando alguma coisa. Parou em um aplicativo e o abriu.

Olhou ao redor, não tinha ninguém na copa. Não que estivesse com vergonha, mas seria desconfortável ser interrompido enquanto procurava por futuros encontros em um aplicativo. 

Olhou a hora no celular, ainda tinha uns cinco minutos de intervalo, começou a passar o dedo pelo aparelho rolando as imagens e lendo os perfis. Alguns pareciam atraentes, mas o perfil era tão sofrível. Já estava recorrendo a um aplicativo para arrumar um encontro, ao menos que fosse com alguém por quem conseguisse nutrir o mínimo de interesse que não apenas o sexual. Não esperava romance, ou algo mais além de uma noite, mas também não precisava se envolver com alguém que possuísse o QI de uma porta. 

Faltando um minuto para terminar seu intervalo encontrou alguém que parecia interessante. Olhou a foto, a descrição do perfil… Parece satisfatório… Pensou clicando na foto do rapaz e guardando o celular. Precisava voltar ao trabalho. 

Guardou suas coisas e desceu. Mais tarde verificaria se o interesse foi mútuo.

Continuou seu trabalho até que percebeu com grande alívio que o expediente havia terminado. Registrou sua saída na máquina de ponto e guardou o colete no armário e o crachá na bolsa. Com um aceno despediu-se dos colegas e saiu da loja estranhando a silhueta que parecia estar travando uma enorme batalha interna sobre entrar ou não no estabelecimento. Franziu o cenho ao abrir a porta da loja e encontrar um nitidamente confuso e embaraçado Camus do lado de fora. O dia estava calmo demais para ser verdade.

— Posso ajudar em alguma coisa senhor… Camus? — Sorriu de lado, mantendo a sobrancelha erguida.

— Neste momento, só você pode me ajudar Sorento. — Camus falou sincero se aproximando do flautista. 

— E no que posso ser útil? 

— Primeiro, gostaria que parecesse de me chamar de senhor e segundo… Será que podemos conversar? 

Sorento avaliou o homem que tentava mascarar a inquietação por detrás do sorriso estranhamento sincero.

Dessa vez, os fios ruivos estavam soltos e voavam na direção do vento, mantinha os óculos escuros mesmo em um dia nublado, e as roupas pretas que já havia reparado serem de predileção dele. Conteve um suspiro quando Camus tirou os óculos e pôde perceber mais do que gostaria naquele olhar. Aquele homem era solitário.

De tal forma que jamais poderia ter imaginado.

Em certa medida lembrava um pouco a solidão que já sentiu, mas parecia ser diferente, mais intrínseca. O olhar e o sorriso o desarmaram. Não queria problemas para a sua vida, mas naquele momento, Camus não parecia o tipo de questão que poderia evitar. 

— Claro, sempre podemos conversar. Caminhe comigo até o metrô. 

— Não gostaria de parar em outro lugar?

Sorento o olhou com o canto do olho e começou a andar. 

— Quis dizer um café ou algo do tipo.

— Imagino o que você quis dizer, Camus. Mas o máximo que estou disposto no momento e andar até o metrô e depois até minha casa. Estou exausto! 

— Você não descansa muito não é? 

A pergunta continha um tom de genuína curiosidade, o que de certa forma surpreendeu o flautista que continuava na defensiva. Camus era mesmo um mistério. 

— Não tanto quanto gostaria. O presente fez sucesso?

— Sim… Acredito que sim. — Sorriu — Vou saber maiores detalhes amanhã. 

— Espero que a resposta seja positiva. Além disso, obrigada pelo livro Camus. Fiquei… Sinceramente feliz.

O sorriso de Camus se alargou e Sorento involuntariamente prendeu a respiração ao notar que sem sombra de dúvidas, ele deveria distribuir esse tipo de sorriso por aí. 

— Que bom! Quer dizer que já não configuro mais seus pesadelos? — Riu.

— Quem sabe… Ao menos começou a sair deles. — Acompanhou o riso. 

— Já é um começo… — Camus colocou uma mexa do cabelo vermelho atrás da orelha — Me falaram esses dias que tudo precisa de um começo. 

— Concordo. Precisamos partir de algum ponto. 

— Sorento… — Camus parou a caminhada avistando a entrada do metrô. — O que você pensa sobre mim?

O flautista se espantou com a perguntando, parando de frente para o ruivo e não conseguindo mascarar o assombro. 

— Ora Camus… Eu não tenho muitas informações para deduzir algo sobre você. 

— Mentira! Claro que tem. Com o que você tem, o que diria sobre mim? 

— Bom… — Respirou fundo — Você me parece estar a maior parte do tempo atuando. O predador quase psicótico não parece o mesmo cara que comprou um livro comigo. E muito menos o homem com quem estou conversando agora. 

— E qual deles você prefere? 

— Sem dúvida o que sorri com sinceridade genuína, sem o intuito de seduzir todos os seres viventes ao redor. Esse tem mais capacidade de conquistar amantes… Ou amigos, que o homem que acobertei no Imperador.

Camus sustentou o olhar do jovem à sua frente e percebeu que ele lembrava alguém, não fisicamente, mas os modos e o jeito de se expressar. Já havia percebido isso. 

— Obrigado, Sorento. — Sorriu retomando a caminhada. 

— Não por isso… — Olhou para Camus — É sobre esse tipo de sorriso que eu falava. — Comentou chegando na entrada do metrô. — Agradeço a companhia até aqui.

— Eu que te agradeço. Quem sabe na próxima você não toma um café comigo. 

— Quem sabe… 

Virou na direção dele para se despedir e ao mirar os olhos conflituosos, tirou um caderno e uma caneta de dentro da bolsa, anotando alguma coisa e guardando tudo em seguida. 

— Quando quiser conversar pode me ligar. — Entregou o papel a Camus. 

O ruivo olhou o número por alguns segundos, sorrindo em seguida e anotando no celular, sob o olhar atento de Sorento. 

— Então quer dizer… — Sorriu malicioso.

— Quer dizer que para isso, a resposta continua sendo não… Mas não desgosto de nossas conversas. Você é um homem interessante Camus, só quero saber o quanto. 

Sorento sorriu, virando de costas e caminhando até o metrô. Camus ficou parado, o sorriso bobo nos lábios acompanhando o caminhar elegante do homem que parecia transitar por todos os ambientes nos quais se encontrava.

Esqueceu de perguntar como nunca o tinha visto na livraria e quais seus dias no Imperador. Na verdade, não falou nada do que havia planejado. Mas a conversa saiu melhor do que esperava. Respirou fundo e decidiu voltar a livraria, já que estava por ali, poderia matar seu tempo de forma produtiva e prazerosa. Quer dizer que sou um homem interessante? Por essa não esperava. 

 

***
 

Deusa decidiu que o melhor lugar para dormir eram as costas de seu humano. 

Ela calmamente procurou o melhor posicionamento, girando sobre seu próprio eixo e quando encontrou o ângulo adequado, seguindo seriamente sua lógica felina, tateou a carne firme levemente avaliando que tipo de força deveria empregar. Isto decidido tratou logo de iniciar uma vigorosa massagem, movimentos de sovar massa de pão, soltando um pouco suas garras, afinal o resultado final deveria ser macio. 

Essa movimentação foi trazendo Kanon a consciência. Até o ronronar da gata parecia agressivo aos seus ouvidos.

Ressaca definitivamente era um castigo infernal. 

Ele resmungou, sendo sumariamente ignorado, percebeu então que o ronronar irritante era seu celular vibrando. Demorou longos minutos para encontrar o aparelho. A cabeça latejando com a luz que entrava pela porta da varanda, claro que foi idiota o bastante para se esquecer de fechar as cortinas. A gata se esparramou no lugar antes ocupado por ele aproveitando o calor residual. 

Kanon encontrou o celular e olhou o celular com a vista ainda turva. Atendeu antes que a pessoa do outro lado desistisse. 

— Alô, Milo?

— Não. Oi Kanon, é Isaak… Te acordei? 

Kanon apertou os olhos com força voltando a olhar a tela do celular, tudo confuso, voltou a falar:

— Isaak, ei… Eu estava acordando já — mentiu — Tudo bem com você?

— Sim… Kanon, eu posso ligar outra hora se estiver te atrapalhando…

— De jeito nenhum! Não me atrapalha. Estou acordado já. Você… Quer vir para cá e podemos conversar?  

Escutou o sorriso de Isaak do outro lado da linha como se pudesse vê-lo e sentiu um frio na barriga começar a surgir. Seria possível que aquele moleque o tivesse nas mãos tão entregue?

— Estação do Parque Central, não é? Você me encontraria na catraca do metrô… Daqui uma hora? 

— Sim, Perfeito! Te pego lá em uma hora. Qualquer mudança me avisa!

— Ok…

— Até logo!

Kanon desligou e passou a mão pelos cabelos. Em 10 minutos de caminhada estaria lá.

Precisava tomar banho, um comprimido para a dor de cabeça e quem sabe beber um suco. Ou vários.

Seu corpo vibrava de antecipação. Nem queria pensar se havia sido precipitado ou não. Precisava se afundar novamente em Isaak, depois pensaria em como resolver sua vida. Ergueu-se maldizendo a ideia de tentar acompanhar o ritmo de Julian na noite anterior.

Maldizendo a idade e principalmente sua estupidez.

Arrancou as roupas e se enfiou embaixo de um jato de água gelada. Mal pode segurar um gritinho.

Odiava água gelada. Porém, naquele momento era o que precisava. Se esfregou vigorosamente, lavou os cabelos e escovou os dentes. Depois do banho se trocou, e observou no espelho as olheiras em seu rosto.

Respirou fundo e se preparou para encontrar Isaak, era hora de acertarem as contas.

 

 

 

Continua...

 


Notas Finais


Como sempre nossa mais tenra gratidão a quem está acompanhando.
Nos vemos em breve?

Beijos


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