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História Não Conte Nosso Segredo - Capítulo 10


Escrita por: vauseman_damie

Notas do Autor


Ultimo.

Capítulo 10 - Capítulo 10


CAPÍTULO 10

— Você já concluiu o esforço hercúleo de preencher as duas fichas de inscrição? — Mamãe perguntou à mesa do jantar. — Precisam ser postadas na semana que vem.

— Sim — falei.

Mamãe me fitou. Alex tinha razão, eu era uma péssima mentirosa.

— Vou fazer isso amanhã.

— Continua dizendo isso. — Mamãe passou a tigela de creme de milho para Neal. — Mas já estão acabando os amanhãs no seu calendário.

Estão acabando os amanhãs, repeti para mim mesma no quarto, espreguiçando-me na cama para começar uma nova maratona de lição de casa à meia-noite. Às vezes, eu tinha a sensação de não haver amanhãs, de que tudo, toda a minha vida, estava embutida em um único e interminável dia. Uma linha contínua de tempo sem sentido. Se os amanhãs eram tudo o que eu tinha a esperar, às vezes eu até desejava que não houvesse amanhã.

Abri o livro de economia, depois fechei. Em vez disso, surrupiei da mochila meu caderno de desenho. Até o momento, ele trazia um desenho hachurado de página inteira da cabeça da Alex, o ângulo lateral da sua orelha, um desenho da sua mão direita sobre a mesa com a coleção de anéis que ela sempre usava. Eu não estivera perto o bastante para captar os detalhes dos anéis.

Na página seguinte, havia o desenho do interruptor de luz — nossa, que incrível! Virei uma página em branco. Com a sombra em meia-lua da luminária da minha escrivaninha, as vigas do porão dariam uma excelente natureza-morta. Ugh… Eu precisava de inspiração. O que Mackel tinha dito?

— Apenas deixe vir. Não force. Só desenhe livremente. — O que, para mim, significava queda livre. Era em momentos como esse que eu queria estar sob o efeito de drogas.

Certo. Levantei e procurei entre os meus CDs. Não precisei procurar muito. Coloquei para tocar o disco das Dixie Chicks e deitei, fechando os olhos para o “apenas deixe vir”.

O que veio foi ela. O jeito como o canto da boca repuxava, um canto dos lábios ligeiramente mais elevado que o outro quando ela sorria. Aquela sarda ou pinta logo acima do lábio. A cintilação do seu olhar, o calor. E o fogo também, quando estava enfurecida. A pele dela, como parecia brilhar. Posicionei o lápis e comecei a transferir a imagem mental para o papel.

O CD acabou e observei com atenção o que havia desenhado. A cabeça dela, exibindo o boné de beisebol, não estava tão diferente. No entanto, o rosto estava errado. Sem simetria. Eu podia vê-la com tanta clareza em minha mente, ouvir sua risada. Aquele som, a música em sua voz.

A sensação despertava. E me arrebatava de algum modo… quase como…

Como se eu estivesse me apaixonando por ela.

Certo, isso não me chocava. Eu já havia tido quedas por garotas antes. Quero dizer, quem não teve? Eu via uma garota no shopping ou na competição de natação e pensava: Uau, como gostaria de conhecê-la. Não agia por impulso nem nada assim. Eu me freava.

É assim que era com Alex. Um interesse inocente. Eu a admirava. Ela era forte, autoconfiante. E tão legal. Atraente de um jeito que só outra garota conseguiria ver.

O que eu via? Não sabia ao certo. Não podia capturar isso no papel. O desenho — ela — não queria ficar parado.

Deixei o caderno de desenho de lado e me pus de pé para retirar o CD e guardá-lo na mochila. No alto das escadas, encontrei Mamãe e Neal na cozinha, acariciando-se.

— Aaah! Peguei vocês! — Falei, brandindo um dedo acusador.

Mamãe corou. Pegando meu casaco do cabide, informei a eles:

— Vou sair um pouco.

— Mas com esse tempo? — Mamãe pareceu consternada.

— Caso eu seja mandada pro hospital, minha roupa de baixo está limpa.

A Washington Central era mais longe do que parecia. Eu havia impresso um mapa da internet no laboratório de informática, hoje, durante a sessão de estudo livre. A legenda devia estar errada, devia ficar a mais de quarenta quilômetros, e as ruas estavam puro gelo. Um farol ficou vermelho de repente e pisei no freio, derrapando no cruzamento. Buzinas soaram e uma van não me acertou por pouco.

Droga. Meu coração martelava as costelas. O que eu estava fazendo?

Tinha que vê-la. Conversar com ela. Pedir desculpas pelo incidente do armário. Pedir desculpas pelos cretinos de nossa escola. Tentar consertar. Ainda que os funcionários tivessem pintado as portas no final do dia — apagado as evidências do crime para que pudéssemos fingir que ele nunca aconteceu —, ela só podia estar abalada. Eu queria abrandar seus medos.

Pisando no acelerador de leve e desviando do meio-fio, segui em direção à cidade. Depois de dar a volta no relógio duas vezes, eu a encontrei: Hott ’N Tott Donuts.

Dez minutos mais tarde, eu ainda estava encolhida no estacionamento, tremendo de frio. E não apenas de frio.

— Isso é idiotice — murmurei. — Sai já daqui. — Do que é que eu tinha medo?

Dela, é claro. Isso não tinha nada a ver com o incidente do armário. Eu queria que ela gostasse de mim. Queria descobrir se gostava de mim. Isso era assim tão importante para que eu arriscasse minha vida? Aparentemente, sim.

Estava tão frio. Dei a partida no motor e liguei o aquecedor.

Ela nem sequer estava ali. Não cheguei a captar nenhum relance dela através das paredes de vidro em todo o século que fiquei, parada, ali, congelando minha bunda. Eu estava segura. Só vim dar uma olhada no lugar, comprar um café. Razoável. Racional. Apenas um cliente tinha enfrentado o frio: um motorista de táxi, encolhido em uma das mesas, segurando um copo de café enquanto folheava um jornal.

— Vai lá e compra um donut. Qual é o problema?

Certo. Reuni minha coragem. Abri a porta do jipe e saí.

— Boa noite. Posso ajudar? — O homem mais velho atrás do balcão perguntou. Ele sorriu com simpatia. Será que era esse o tio da Alex?

Sorri também.

— Vou querer um daqueles. — Apontei para um enroladinho de canela com glacê. — E… você teria chocolate quente?

— Claro. Qual tamanho?

Passei os olhos no display dos copos.

— Médio, eu acho.

— Para tomar agora ou para viagem? — Ele ligou a máquina de chocolate quente.

Meus olhos investigaram o interior da lanchonete. Nenhum sinal dela.

— Para viagem — respondi.

Ele terminou de preparar meu pedido e marcou na caixa registradora.

— A Alex está por aqui? — Perguntei, passando uma nota de cinco dólares.

— Alexandra! — Ele gritou para além da porta traseira.

— O quê? — Ela gritou em resposta.

Meu coração acelerou. Explodiu.

— Você tem visita.

Alex apareceu do nada, limpando as mãos cheias de farinha no avental. A cabeça dela estava coberta com uma bandana azul, amarrada em estilo cigano. Quando ela me viu, paralisou no vão da porta.

Bem, finalmente consegui deixá-la atordoada.

— Ei. — Levantei o queixo. — Eu estava passando pelo bairro.

O vestígio de um sorriso se infiltrou nos lábios dela.

— Tio, tudo bem se ela entrar?

Ele me olhou de cima a baixo.

— Acho que sim. Claro. — Ele abriu o topo do balcão, que era articulado de um lado. — Nada de gracinhas. — Ele apontou o dedo para Alex.

Ela soltou uma baforada de ar na direção dele.

O que ele quis dizer com isso? Nada de gracinhas?

Alex caminhou pelo recinto até uma longa mesa de açougueiro. Eu a segui.

— Pode puxar um banco se quiser — ela falou por cima do ombro.

Deixei meu chocolate e o enroladinho sobre a mesa, puxei um banco de encosto alto e me sentei em cima dele.

Alex levantou um rolo de macarrão e passou-o por cima de um círculo de massa.

— O que você veio fazer aqui de verdade? — Ela perguntou.

— Como eu disse…

— Estava no bairro. — Os olhos dela se desviaram para mim e ela sorriu. — Deixa eu levar isso para o forno. Só um minutinho. — Ela salpicou canela e açúcar sobre a massa, enrolou-a como uma cobra e cortou em pedaços idênticos, como se estivesse acostumada a fazer isso a vida toda.

— Sinto muito pelo que aconteceu hoje — falei.

— Esquece. Não foi culpa sua. Pega pra mim aquela bandeja. — Ela indicou.

Encolhi diante do gesto abrupto dela. Puxei uma grande bandeja de alumínio da prateleira atrás de mim e passei para ela. Com uma espátula, ela colocou os pedaços na bandeja, depois levou-a até uma cômoda com porta de vidro, onde havia prateleiras com outras bandejas parecidas. O forno, imaginei. Nunca tinha visto o trabalho interno de uma loja de donuts. O ambiente era todo de metal reluzente e odores picantes. Brilhante, doce e morno. Então, por que eu estava tremendo?

Alex voltou, soltando um suspiro cansado, e se inclinou sobre a mesa com os braços dobrados.

— O quê? — Falei.

Ela sorriu e balançou a cabeça, olhando para o chão.

— Nada.

— Você trabalha aqui todas as noites? — Beberiquei meu chocolate.

— Por que você não passa aqui e descobre? — Ela levantou os olhos, prendendo os meus.

Esse jogo podia ser jogado em dupla.

— Você ia gostar, não ia?

Ela abaixou a espátula.

— O que você acha? — Ela disse.

Acho que fiquei sem ar.

— Alex, quando você terminar com os rolos, pode bater uma porção de ovos para a mistura de amanhã cedo? — O tio dela gritou através da porta.

— Sim, senhor capataz! — Ela gritou de volta.

Eu gostava disso, das brincadeiras. Gostava de tudo a respeito dela.

— O que foi? — Ela me fulminou de novo.

Desviei o rosto, percebendo que estava olhando para ela.

— Não sei. — Meus olhos resvalaram pelo piso de lajotas igual a um tabuleiro de xadrez.

— Se você não sabe, então não posso ajudar. — Alex passou por trás de mim, quase encostando no meu braço. Quase.

— Tudo bem, então vou ajudar a mim mesma — brinquei, pegando meu enroladinho de canela da mesa e mordendo a ponta.

Ela desapareceu em uma sala aos fundos. Alguns segundos depois, voltou carregando um saco de farinha.

— Olha — ela disse, colocando o saco em cima da mesa —, eu tenho muita coisa pra fazer, certo? E não gosto de ficar fazendo jogo.

O calor cozinhou meu rosto.

— Desculpa. — Deslizei do banco; na verdade, desabei. E deixei cair meu enroladinho no chão. — Eu vou embora. — Peguei-o de volta. Enquanto eu cambaleava em direção à porta para fugir, escapar, ouvi-a xingar e acertar a mesa com um soco.

Ela me odeia, pensei. O que foi que fiz? Ah, Deus. Ela me odeia.

Pela primeira vez na vida, não consegui terminar a lição de casa. Havia acertado o despertador para as cinco da manhã, mas, em vez de pegar os livros, fui nadar.

Quando cheguei, as luzes ainda estavam apagadas em torno da piscina e tudo estava tão silencioso que meus passos faziam eco. Mergulhei.

O frio inundou minhas veias, um alívio bem-vindo. Concentrei minha atenção nos músculos contraindo, meus braços cortando a água. Logo, o ritmo de respirar e dar braçadas, respirar e dar braçadas afogou meus pensamentos. Exilou meus sentimentos para um canto escuro da mente, o lugar onde eles deveriam ficar.

Esqueça-a. Tire-a da cabeça, arranque-a de dentro de você.

Não sei por quanto tempo nadei. Nadei voltas, e mais voltas, e mais voltas a me entorpecer. Meus pulmões e músculos entraram em colapso simultâneo, e deixei meu último impulso me propelir para a borda.

Ali estava ela, sentada, com os cotovelos nos joelhos. Ela me olhou nos olhos e disse:

— Eu estava passando pelo bairro.


Notas Finais


Pessoal, só uma dúvida: Estão curtindo mesmo a história?


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