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História O Caminho da Andorinha - Ao Seu Lado


Escrita por: B4dWolf

Capítulo 57 - Ao Seu Lado


Teméria, 1279.

Montanhas de Mahakam.

 

 

            -Taberneiro! Mais vodca para essas beldades aqui!

            O anão Garvey não parava de rir. Havia perdido todo o dinheiro que havia em seu bolso no gwent, e só os deuses sabem como ele faria para pagar a conta daquela estalagem, mas ele sequer se importava. Estava na companhia de duas exóticas mulheres, da Zerrikânia. Sua pele morena e roupas tribais fascinava o anão, apesar de saber que um movimento em falso e uma delas poderia arrancar sua cabeça com aquelas estranhas espadas entortadas. Nunca o anão pôde concordar tanto com o ditado de que havia uma beleza encantadora na morte.

E morte era algo que ele havia acabado de encarar. Fazia dois dias que alcançara as Montanhas de Mahakam, depois de ajudar a rebelião de Anais. Como todo bom mercenário, o pouco que ganhara na guerra já havia escoado por entre canecas de cerveja e apostas em Gwent. Isso não o chateava. Era adepto do lema “viva um dia de cada vez como se fosse o último”.

Tão adepto que ousou apertar a bunda de uma das zerrikanas, que em retaliação deu-lhe uma boa mordida em sua orelha. Os anões riam enquanto um pedaço da orelha de Garvey voava pela estalagem. Anestesiado pelo álcool, Garvey riu como os outros enquanto sangue escorria por seu pescoço

-Essa é das brabas! – disse. Possivelmente, só se daria conta do que perdera metade da orelha no dia seguinte. Como muitos outros, pensou Borch. A perda da orelha do anão tirou a concentração do sujeito de cabelos dourados, mas momentaneamente. Borch lançou sobre a mesa uma carta de herói de Eredin, causando pasmo e admiração no rosto dos anões que, em grande expectativa, acompanhavam aquela partida.

Gusman, seu oponente, respirou. Olhou para seu deck, que continha apenas uma carta. Respirou de novo. Por fim, jogou a carta para o alto. Era uma isca, notaram os presentes. Borch gargalhou junto com os demais.

-Parece, meus senhores, que sairei de Mahakam com um belo deck de anões. Pode me passar o seu Zoltan Chivay, senhor Gusman.

Resmungando, o anão assim o fez. Entregou a carta de Zoltan a Borch, que sabidamente a colocou em uma pilha de cartas, todas da facção Scoia’tael. No momento, já havia vencido 21 anões em um jogo onde cada um colocava na aposta sua mais valiosa carta. Como era de esperar, Borch colocou nada menos que Villentretenmerth na aposta, e isso atraiu a cobiça de todos os anões. E agora, eles pagavam com suas melhores cartas. O dragão dourado duvidava que os anões de Mahakam se recuperariam tão cedo do baque ter seus baralhos enfraquecidos.

-Pelas bolas de Lebioda, ele ganhou de novo!

-O sujeitinho é bom! Deve ser profissional...

-Eu nunca ouvi falar dele!

            -Quem é o próximo? – tamborilava na mesa Borch. Os anões começaram a se entreolhar, nervosos. Ninguém queria perder sua carta mais valiosa. Por fim, alívio se seguiu quando perceberam adentrar à estalagem uma figura bastante incomum por ali.

            -Iorveth! – exclamou Borch, guardando as cartas em sua bolsa de couro.

            -Borch. Vejo que ainda não partiu de Mahakam.

            O sorridente dragão dourado levantou-se.

            -Estou contente por vê-lo vivo.

            -Precisamos conversar. Me acompanhe. – pediu o elfo, em um tom exigente. Pouco acostumado a isso, Borch fez uma leve careta, mas decidiu, por fim, seguir Iorveth. Seus pensamentos estavam desordenados em hipóteses e incertezas, e entretanto, todos conduziam a uma única palavra.

            Saskia.

 

 

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            -Onde ela está?

            Borch sentou-se em um banco de madeira. Já na casa de Iorveth e Saskia, o dragão dourado pôde ver melhor o seu estado. Iorveth estava magro e ainda havia olheiras profundas em seu rosto. Estava com uma roupa diferente do dia em que se encontraram. Ele vestia agora um típico colete Scoia’atel, mas com a adição de alguns brasões de Reinos do Norte pendurados por sua roupa, cuja razão o dragão dourado já suspeitava que fosse souvenirs de homens mortos por sua espada. Cheiro de sangue empesteava sua roupa, embora o elfo tenha tido o cuidado de lavá-la. Mas o cheiro ainda era perceptível em seu olfato extremamente sensível de dragão.

            -Em segurança. E bem.

            -Como sabe?

            Borch riu, enquanto alisava sua mandíbula cerrada por sua barba por fazer.

            -Você não entenderia... É uma.... Coisa de dragão, sabe?

            Iorveth rolou seu único olho. Ergueu-se da cadeira com certo cansaço.

            -Me leve até ela.

            -Minha palavra não é o suficiente?

            -Não vou ficar aqui, sentado e esperando por ela e por notícias da criança... Ou o que quer que seja. Eu quero encontra-la.

            Borch negativou com a cabeça.

            -Acredite em mim: é mais seguro que você fique aqui.

            -Diz isso a um homem que acabou de retornar de uma guerra. Não me importo com segurança. Eu quero estar ao lado dela.

            -E para quê? Para se horrorizar diante de minha filha quando um pequeno dragão quebrar a casca do ovo? Ou para tomar o bebezinho dela com o intuito de vê-lo crescer longe da monstruosidade que é a mãe dele?

            Iorveth se horrorizou.

            -Eu jamais faria isso. Nenhuma das duas opções. Jamais. O que quer que aconteça, o que quer que... “Nasça” deste ovo, tem meu sangue também. Tem um pouco de mim. E um pouco de Saskia. E isso é o bastante para eu amá-lo.

            Borch levantou-se. Estava pensativo. Levou as duas mãos para o pescoço, massageando-o. Fechou os olhos, pensando, e assim permaneceu por um bom tempo. Iortveth percebeu as pálpebras de Borch estremecendo. Teve uma breve sensação de que o dragão estava conversando telepaticamente com alguém. Decerto com Saskia.

            -Está bem. Você vem comigo. Mas já o aviso: se você reagir mal ao nascimento, eu o devorarei e lancarei seus ossos no abismo. Entendeu, elfo?

 

 

 

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            Saesenthessis olhava o sol nascendo timidamente, cobrindo as belas terras de Dol Blathanna e dissipando a névoa que ali permanecera desde a última noite. Fazia muit tempo desde a última visita de Saesenthessis ao Vale das Flores, de modo que o progresso naquela região era notável. Era possível avistar, pequeninos no horizonte, algumas construções élficas e seus desenhos retilíneos sendo tocados pelo sol. Saesenthessis imaginava os elfos vivendo ali. Tranquilos, sem ter que se preocupar com os humanos e suas ameaças. Um ideal que por um tempo a própria Saesenthessis lutou.

            Seu pai Villentretenmerth havia sido contra sua escolha em chocar o ovo nas Montanhas Azuis. Dizia que ainda havia atividade humana e élfica por lá e que ela deveria ficar em paz até que o ovo fosse chocado. O dragão dourado recomendo as isoladas e inóspitas Montanhas do Dragão, ou mesmo a Zerrikânia, onde dragões jamais eram incomodados, mas Saesenthessis foi irredutível em sua escolha. Garantiu a Villentretenmerth que escolheria o pico mais alto das Montanhas Azuis e que optaria por voar por terras isoladas, de preferência longe do Vale das Flores para que não fosse avistada por nenhuma criatura.

            Preocupada com seu bem-estar e também com o de seu filho, Saesenthessis seguiu seu plano com rigor. Não foi vista por ninguém. Evitou o vale, bem como as pequeninas aldeias de Aen Seidhe espalhadas em locais estratégicos da montanha. Optou por ir pelo Sul, em um ponto de floresta virgem onde só alguns monstros faziam de morada.

            Escolheu a montanha mais alta como refúgio. Não havia sinais de qualquer civilização ali, e isso tranquilizou Saesenthessis. Ao pousar, Saesenthessis espalhou algumas pedras e fez um agradável ninho para proteger-se dos ventos fortes que cortava o cume daquela montanha sem parar. Ao seu redor, nuvens e mais nuvens. Por quase todo tempo, era assim. Raros eram os dias em que Saesenthessis era capaz de ver as Montanhas Azuis que jaziam abaixo daquela montanha, cujo nome ela não sabia. “Iorveth deve saber”, acreditava Saesenthessis.

            E seu pai estava certo. Com alguns dias de permanência em sua forma draconiana, o ovo já estava em seu ninho. Saesenthessis sentiu uma sensação inexplicável ao perceber que seu filho – meu filho com Iorveth, ela pensou – estaria prestes a nascer. Mas a alegria juntou-se ao pavor. Não foram poucas as noites que Saesenthessis sonhou com um Iorveth renegando o pequeno dragão que Saskia trazia em seu colo. Houve, entretanto, aqueles sonhos em que Iorveth atrapalhava-se com fraudas, ou assistia com orgulho um pequeno dragão cortar os céus. Eram estes sonhos que Saesenthessis procurava se agarrar.

            De acordo com as explicações de seu pai, restavam apenas alguns dias para o ovo chocar, e suas incertezas finalmente se dissiparem. Por vezes, Saesenthessis mal conseguia dormir, ou sair para caçar algum monstro habitante daquela montanha isolada e se alimentar.

            E para completar sua ansiedade, seu pai conversara telepaticamente com ela. Iorveth queria vê-la. Não apenas vê-la, mas estar com ela. Até o fim. Saesenthessis sentiu-se comovida e ao mesmo tempo desesperada. Numa tentativa de tranquiliza-la, Villentretenmerth disse que o mataria se ele fizesse algo contra a “criatura” que estava prestes a nascer. Coube a Saesenthessis alertare seu pai que, qualquer que fosse a reação de Iorveth, esse era um problema que ambos, como casal, deveriam enfrentar, sem interferência de terceiros. “Espero que faça a coisa certa”, foi o que disse Villentretenmerth.

            A ansiedade de Saskia teve um fim quando ela viu algo cortar o céu. Pequenino ainda no horizonte, percebeu seu pai Villentretenmerth se aproximar, batendo suas asas majestosamente. Assim como ela, Villentretenmerth havia optado por um caminho inabitado, para não chamar a atenção.

            Villentretenmerth pousou graciosamente. Fez subir algumas pequenas pedras em seu pouso, apesar do cuidado. O dragão inclinou-se, permitindo que seu “passageiro” pudesse fimalmente chegar a terra firme.

            -Pelo menos Saesenthessis escolheu um bom lugar. – disse Villentretenmerth, transformado em Borch Três Galhas assim que Iorveth deu as costas. O elfo acreditava que jamais se acostumaria a tamanha demonstração de poder vindo de seu “sogro”, como chamam os dh’oines.

            Não foi difícil encontrar Saesenthessis. O dragão negro estava deitado sobre algumas pedras, que faziam o seu contorno. Saesenthessis parecia sorrir, mas nada disse. Nem Iorveth cobrava dela uma resposta. Saskia jamais teve a habilidade de falar enquanto transformada.

            -Ela está feliz por ver você. Muito feliz. – disse Borch, esfregando a palma das mãos. – Parece que minha forma humana não irá aguentar esse frio.

            Apesar de acostumado com o frio nas Montanhas Azuis, Iorveth não podia retrucar Borch. Ventava forte e sua boca já começava a esfumaçar, muito embora o elfo estivesse bem agasalhado. Ainda bem que ele trouxera um cobertor de pele de urso, mas ele duvidava que isso seria o bastante para aguentar aquele rigoroso clima de montanha.

            -Se eu fosse você, me aconchegava a Saesenthessis. – disse Borch, com uma piscadela. – Olha, estou falando sério.

            Iorveth voltou seu olho para Saesenthessis. Em sua forma draconiana, Saskia era capaz de inspirar medo, respeito e admiração. Medo, porque ela tornava-se capaz de mata-lo em um piscar de olhos. Respeito, porque sabia que sua vida a transitar entre dois mundos lhe era um fardo. E admiração porque ela permanecia bonita, mesmo nesta forma.

            Iorveth caminhou para perto dela. Saesenthessis soltou um suspiro pelas ventas que fez sacudir um pouco de terra. Iorveth lamentava-se por não ouvir sua voz. Sentia falta dela. Sentiu falta por todas as semanas que passou na Teméria. Mas ele sabia que faltava pouco para ouvi-la novamente.

            Erguendo sua mão, Iorveth acarinhou a cabeça de Saesenthessis, que soltou um suspiro gracioso e fechou os olhos com seu gesto. Iorveth duvidava muito que Saesenthessis era capaz de sentir o leve toque de seus dedos  por aquele grosso couro que revestia seu rosto. Ainda assim, Saesenthessis parecia emocionada apenas com a atitude de seu gesto.

            -Estou aqui. O que quer que aconteça, não vou te abandonar.

            Saskia soltou mais um suspiro pelas ventas. Iorveth sentiu que era esta uma reação positiva.

            -Borch disse que será questão de dias até o ovo se chocar. Trouxe comida o bastante para isso. – disse o elfo, abrindo uma bolsa repleta de frutas e tigelas. Curiosamente, Iorveth pôde ver na expressão de Saesenthessis um leve encurvamento no canto de sua boca, agora aberta. Ela estava... Rindo?

            -Já sei. Você deve estar pensando “a comida sempre em primeiro lugar”.

            Iorveth ouviu um grunhido semelhante a uma gargalhada. Sem dúvida, era riso mesmo. O elfo aproximou-se de Saesenthessis, que ergueu levemente sua cauda, deixando espaço o bastante para que ele se aconchegasse. Logo o elfo assentou-se, aliviado por ver que Saesenthessis era uma ótima fonte de calor e que sua cauda era capaz de proteger-lhe das rajadas de vento daquela montanha.

            -Aposto que você deve estar louca para saber quem ganhou a guerra, não é mesmo? – recebendo um granhido em resposta, Iorveth riu. – Pois bem, Saskia. A Teméria venceu. Mas antes, deixa eu te contar alguns detalhes...



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