Desesperado, com medo, afundado em um poço escuro e sem fim que possuía inúmeros demônios que acabavam o engolindo por completo. Era dessa forma que Kim Taehyung se encontrava enquanto encolhia-se contra si mesmo em um canto de seu quarto completamente desarrumado e caindo aos pedaços. A respiração desregulada falhava a todo momento conforme as lágrimas escorriam, sem cessar, por seu rosto. O garoto, então, levou a mão direita até o bolso de sua calça e pegou seu celular. Seu corpo todo tremia de tal forma que era quase impossível manter o aparelho preso em suas mãos e era ainda pior conseguir digitar o número que desejava. Tentou, a todo custo, acalmar-se um pouco, porém não teve sucesso. O choro não lhe dava uma trégua e a tremedeira parecia só aumentar conforme os segundos passavam. Por fim, conseguiu teclar os números certos e ligar para a pessoa que desejava.
— Hyung... — Taehyung sussurrou, rouco, em meio as lágrimas quando o outro atendeu. — Eu quero ver meus amigos, hyung...
— Tae? O que aconteceu? Foi aquele cara de novo? — a voz do outro lado da linha era repleta de raiva. — Eu vou matar esse filho de uma puta.
— Não... Hyung, eu só quero ver meus amigos. Por favor... — e o choro tomou conta de vez do mais novo.
Os olhos, agora fechados, apertavam-se cada vez mais conforme os soluços e o choro audível avançavam. Então, um murro na porta do quarto de Taehyung fez o garoto assustar-se e uma tosse o invadir, rompendo o choro.
— Tae, respira fundo. — O mais velho tentou manter a voz o mais calma que conseguia. — Eu vou ligar para os outros e iremos nos encontrar, tudo bem?
— Obrigado, Hyung... — Taehyung sussurrou.
— No lugar de sempre, ok? Vamos estar lá o mais rápido possível. — A voz do outro lado da linha era repleta de preocupação. — Toma cuidado ao sair daí. Pelo visto o desgraçado tá chapado de novo.
— Eu vou me cuidar, Hyung... Logo estarei lá. — Taehyung engoliu em seco e encerrou a ligação.
Levantando-se enquanto usava a parede como forma de apoio, Kim Taehyung usou as costas de sua mão para limpar o rosto. Olhou para a porta e respirou profundamente, reunindo coragem para ir destrancá-la e correr para fora daquela maldita casa. Contou até três mentalmente, mas, ao chegar até ela, acabou recuando assim que tocou na maçaneta. Encostando a testa na madeira velha, Taehyung choramingou consigo mesmo, odiando-se por ter medo daquele homem nojento. Fez novamente uma contagem mentalmente e destrancou a porta, abrindo-a de forma lenta em seguida.
Olhou pela fresta que havia aberto e piscou algumas vezes; apenas conseguia ver várias garrafas de bebidas espalhadas pelo corredor e sentiu o cheiro repugnante de álcool invadir suas narinas. Suspirando, Taehyung abriu o resto da porta e saiu de seu quarto nas pontas dos pés. Assim que se aproximou da sala, ouviu um ronco e, finalmente, teve uma sensação de alívio tomar seu ser. O desgraçado estava dormindo.
Correu, então, para fora daquela casa e mesmo fora de lá não cessou sua corrida. Queria estar o mais longe possível daquele lugar, pelo maior tempo que conseguiria mesmo que, no fundo, soubesse que não poderia sumir de lá de vez. Afinal, ele tinha que cuidar dela. Sua irmã. A única pessoa, de sua família, que ele realmente se importava. Quer dizer, única pessoa viva.
Só depois de entrar no bosque que Taehyung parou de correr. Seu peito subia e descia incontrolavelmente devido a pequena maratona percorrida e seus pulmões clamavam por ar. Caminhou, então, pela trilha ao mesmo tempo que respirava fundo, deixando que um sorriso aparecesse em seus lábios. Ele amava sentir o perfume que as flores e plantas daquele bosque exalavam. Isso o fazia se lembrar de sua mãe. E, então, o sorriso desmanchou-se.
Estava na quadra abandonada quando puxou de seu bolso a foto três por quatro de sua mãe. Ele sempre a carregava consigo, não importava para onde ia. Sentia que ela era sua guardiã, mesmo não estando mais entre os vivos. Um verdadeiro anjo, segundo as próprias palavras de Taehyung. Ele não chorou. Não. O garoto se recusava a derramar lágrimas ao ver fotos de sua mãe pois imaginava que isso a machucava. Era como se ela pudesse vê-lo através daquela foto e isso a faria chorar onde que que estivesse.
Chutou o colchão empoeirado que estava jogado no chão e então deixou seu corpo despencar em direção a ele. Assim que ele se deitou, uma nuvem de poeira subiu e fez Taehyung tossir. Apoiou o braço sobre os olhos assim que os raios de sol, que passavam pelas frestas das folhagens das árvores, o incomodaram. E lá ficou, olhando para o céu e folhas como se fossem um misto de tintas azuis e verdes como numa pintura.
-x-
O bosque era um lugar calmo até o momento em que aquele grupo chegava ao local. Risadas eram ouvidas, assim como xingamentos e alguns gritos — tanto nervosos quanto de nítida alegria. O grupo, contendo cinco pessoas, caminhava pela trilha e não dispensava brincadeira alguma. Alguns seguravam gravetos e fingiam estar em um combate mortal e sem fim, como se fossem grandes guerreiros da Coreia feudal. Enquanto isso, o líder, Kim Namjoon, resmungava baixo e dizia o quão patéticos eles eram; tudo o que conseguia era mais dor de cabeça para si mesmo já que o mais histérico dentre eles, Jung Hoseok, decidiu o irritar com o graveto, cutucando-o nas costelas.
Após a caminhada até a quadra abandonada, depois de uma sessão de risadas e xingamentos, o grupo viu Taehyung jogado no colchão. Aproximaram-se, então, sem fazer muito alarde. Sabiam que o garoto estava em momento delicado e não queriam, de forma alguma, acabar piorando a situação. Foi Namjoon que chamou a atenção do garoto, tocando-o no braço.
— O que ‘cê ta fazendo? Vem. — Chamou, com um sorriso e indicou, com um movimento sutil da cabeça, para que ele se levantasse.
Taehyung não falou nada, apenas passou a observar o rosto dos meninos que o rodeavam — cada qual com seus detalhes únicos, como, por exemplo, a pintinha delicada abaixo dos lábios de Jeon Jungkook; o semblante sério, e ao mesmo tempo doce, de Min Yoongi; o sorriso de orelha a orelha que Jung Hoseok carregava sempre consigo; a expressão gentil e amigável de Park Jimin, que sempre lhe trazia a sensação de paz; e, por fim, o olhar firme e encorajador de seu melhor amigo, Kim Namjoon. Taehyung permitiu-se sorrir e se levantou, segurando a mão de Namjoon que estava estendida em sua direção.
Em segundos foi puxado em direção ao meio da quadra e o sol banhou aqueles seis garotos com um calor gostoso de primavera. Não precisaram perguntar nada para Taehyung, cada um deles possuíam problemas próprios, fantasmas e demônios que tinham que lidar por si próprios, mas todos sabiam das dificuldades enfrentadas por cada um. E, talvez, era isso que os mantinham tão unidos: a força que um dava ao outro, o apoio que buscavam e não encontravam em clínicas psiquiátricas, hospitais, qualquer dose de vodka, ou alguma outra bebida que seria a sorteada da noite. Os momentos felizes que eles passavam uns com os outros eram mais eficientes do qualquer medicamento ou palavras vazias de médicos e psicólogos.
Eram sete garotos. Sete pessoas com sonhos destroçados e estraçalhados, pisoteados por pessoas ruins que inclusive eram de suas próprias famílias. Sete vidas entrelaçadas a um forte vínculo de amizade, altruísmo, intimidade e amor. Eram a família que sempre desejaram ter e não conseguiram e esse era um pensamento forte vindo do próprio Jeon Jungkook, o mais novo do grupo. Sete garotos e um desejo de serem, de fato, felizes.
Sete garotos, mas faltava um deles ali. Foi quando, em meio as brincadeiras e risadas, o caçula do grupo apontou para o outro lado e sorriu, claramente animado.
— Olhem! É o Jin hyung! — a voz de Jungkook fez o grupo olhar na direção que ele apontava.
E lá estava o sétimo integrante. Kim SeokJin. Ele era um garoto alto, bonito, com cabelos bem arrumados e de cor negra. Sempre levava consigo uma máquina que usava para tirar fotos do grupo e os filmar; a paixão de Jin era essa: capturar os bons momentos vividos com seus amigos. E ele não perdia a oportunidade de fazer isso, estava quieto e os filmando antes mesmo de Jungkook o avistar e avisar aos outros que estava lá. Sorrindo, SeokJin passou a caminhar em direção ao grupo sem abaixar a câmera.
— Qual é, Jin. Para de filmar, que merda. — Ralhou, Yoongi.
Apesar de parecer arisco e rude, Min Yoongi era uma pessoa dócil e amável — ainda mais com Jungkook. O mais novo, para Yoongi, era a pessoa mais importante de sua vida. Afinal, desde o começo o Jeon o apoiou e o fez voltar a tocar piano mesmo depois daquele maldito acidente. Sem falar que o mais novo despertou sentimentos nunca antes experimentados pelo garoto de cabelos descoloridos.
— Que isso, hyung. — Jungkook riu e bateu seu braço contra o de Yoongi. — Deixe o Jin hyung filmar a gente, é bom guardar recordações... você não acha?
Bufando, Min deu de ombros e tentou ao máximo manter a pose de velho rabugento como era conhecido pelo grupo — aliás, tal apelido fora dado por Jung Hoseok. Ambos eram extremos opostos; enquanto Hoseok demonstrava ser muito imperativo, sorridente e cheio de brincadeiras e piadas para fazer, Yoongi era do tipo quieto, onde quer que pudesse dormir ele se encostava e caia no sono e também não era muito bom em demonstrar afeto, apesar de apreciar a amizade de todos ali.
Conforme o tempo passava, o grupo se divertia e faziam de tudo um pouco. Desde a brincar com uma tampinha inútil de garrafa até ficar observando o caminho que as formigas trilhavam até seus formigueiros. Juntos eles nunca ficavam parados e quando um deles acabava se afastando um pouco era logo puxado para o meio das risadas. E nem quem se encostava na parede e acabava cochilando tinha paz.
Taehyung viu Namjoon dormindo abaixo de uma árvore e logo foi zombar com o amigo. Pegou uma caneta e da forma mais sutil possível desenhou no rosto do garoto, fazendo sinais exagerados quando os amigos riam ou faziam barulhos altos. Finalizando sua arte, pediu, em silêncio, por meio de gestos, que Jin tirasse uma foto. Aproximou seu rosto do mais velho e fez um “v” com os dedos, sorrindo. Assim que o mais velho tirou a foto, Namjoon acordou, meio perdido. Piscando, olhou para Taehyung e notou o garoto segurando a risada.
Em segundos todos começaram a rir; Hoseok era o mais barulhento dentre eles, enquanto ria o garoto se jogava de um lado para o outro, passando a rolar pelo chão e a chorar de tanto que ria. Sem entender nada, Namjoon ficou olhando para os amigos, inclusive Taehyung, com um olhar como se dissesse: “mas que porra é essa?”
Claro, assim que viu a imagem de seu rosto refletida através do vidro do celular de Jimin, Namjoon tratou de ir atrás de Taehyung. Não era a primeira vez que era vítima de tais artimanhas que o mais novo adorava fazer. E, então, passaram a correr de um lado para o outro — Namjoon gritando e xingando enquanto Taehyung tentava ao máximo escapar das mãos do mais velho.
Enquanto isso, Jin tratava de filmar tudo sem tirar o sorriso de seu rosto.
-x-
A noite chegou e os sete estavam dentro de um barracão abandonado ao redor de uma fogueira que fizeram dentro de uma lata velha. Comiam alguns salgadinhos e bebiam cerveja ou refrigerante. Yoongi estava na terceira garrafa de cerveja, os olhos quase se fechavam e sua expressão era triste. Estava sentado no chão com as pernas cruzadas, segurando a garrafa com a mão direita enquanto brincava com um isqueiro com a esquerda. Os orbes escuros logo eram iluminados pela pequena chama que constantemente era acesa e apagada, fazendo-o se recordar do dia mais sombrio de sua vida.
Seus pensamentos foram logo interrompidos ao sentir alguém apoiar a cabeça em seu colo. Estava pronto para xingar e empurrar quem fosse o desgraçado que teve a audácia de o usar como travesseiro, mas, ao ver que se tratava de Jungkook, apenas deu um leve sorriso e guardou seu isqueiro.
— A criança já está com sono? — Yoongi riu, olhando para o mais novo.
— Não sou tão novo assim, hyung. E você também não é tão mais velho. Que saco. — Bufando, Jungkook revirou os olhos. — Não ‘tô com sono, só fiquei um pouco cansado. Se quiser, eu saio.
— Não, pode ficar. — O mais velho tratou de responder o quanto antes e deu um gole em sua bebida.
Sorrindo, Jungkook apenas aproveitou para se arrumar no colo de Yoongi e fechou os olhos. Em questão de segundos o caçula acabou caindo no sono fazendo o mais velho dar um sorriso de canto enquanto o observava. Cutucou Jin, que estava ao seu lado, e pediu uma das mantas que estavam dobradas no sofá próximo ao moreno. Claro, SeokJin não perdeu a chance de tirar uma foto dos dois, o que fez Min xingá-lo baixo para não acordar o Jeon. Após receber a manta, Yoongi cobriu o mais novo e ficou mexendo no cabelo dele, sem nem notar o que fazia.
Jimin observava os dois com um sorriso bobo no rosto, abaixando o olhar as vezes só para não ficar encarando tanto. Para ele, Jungkook e Yoongi formavam um belo par e sabia que o mais novo entre eles nutria um sentimento bem forte pelo rapaz de cabelos descoloridos que tocava piano. Suspirou baixinho, desejando, um dia, ter alguém tão especial assim. Na verdade, ele tinha. Mas não sabia se era correspondido e, por isso, mantinha-se satisfeito apenas com a amizade e intimidade que possuíam.
— O que vocês acham de irmos à praia amanhã? Ou sei lá, qualquer dia desses? — Jin perguntou, olhando para uma polaroid e, em seguida, desviando o olhar da foto, o moreno passou a olhar para os garotos.
— Eu ‘to dentro. — Namjoon falou, inclinando um pouco o corpo para trás e apoiando as mãos no chão.
— Vai ser legal, faz um tempo que queria visitar a praia de novo. — Dessa vez foi Jimin falando.
— É, vai ser legal. —Taehyung sorriu.
Hoseok apenas acenou com a cabeça e quando o grupo se virou para observar Yoongi notaram que o loiro estava dormindo também, com a cabeça levemente inclinada para frente. Começaram a rir baixo, tentando não acordar a dupla e Jin pedia para que ficassem quietos; buscava o ângulo certo para registrar esse momento tão belo e gracioso.
Sabiam que os dois aceitariam ir até a praia, por isso não se preocuparam em os acordar. Então, continuaram lá por um bom tempo, jogando cartas, bebendo, comendo e aproveitando ao máximo a companhia uns dos outros.
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