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História Sobre Sangue e Mar (Alluvium 1) - À Margem


Escrita por: scararmst

Capítulo 36 - À Margem


Quando Bjorn acordou naquela manhã específica, queria acima de tudo poder voltar para a noite anterior. Precisava descansar o máximo possível em casa antes de partir, mas quando ele e Eva se encontraram no corredor, não teria como ter acontecido outra coisa diferente de passarem toda a noite juntos no quarto dele. Teria uma semana para tentar descansar no navio, de qualquer forma.

Como resultado, depois de uma noite passada aninhado à esposa em meio aos lençóis, acabou dormindo apenas por duas horas. Não era incomum algum nervosismo antes de ir a combate, mas era novidade ter algo tão precioso literalmente em seus braços e ter de deixá-la antes de partir.

O sol estava alto no céu agora, e logo Eva se mexeu nos braços dele, abrindo os olhos, devagar. O navio responsável por levá-lo para o ataque na costa ravena partia ao meio-dia, então não tinha muito tempo antes de precisar sair.

Ele apertou o abraço de leve, como se isso pudesse garantir um futuro longo e tranquilo para os dois. Queria poder ficar ali com ela. Ter sua família. Cuidar da diplomacia de seu país e deixar o restante de lado.

Eva abriu os olhos, e Bjorn trocou um olhar com ela por um instante. Havia uma série de palavras pairando no ar, todas ditas mutualmente na noite anterior, ainda ecoando pelas paredes do quarto. Ainda havia muito a dizer, mas as palavras pareciam ter travado em sua garganta, incapazes de sair.

Aquele clima, a tensão suspensa no ar, durou pelos minutos mais curtos da vida de Bjorn. Então, Eva se levantou, puxando o lençol para enrolá-lo ao redor do corpo desnudo.

— Muito bem — ela anunciou, pigarreando. Sentou-se à beira da cama olhando para a janela por um instante, o queixo erguido. Bjorn se sentou também, atrás dela, a abraçando e apoiando o queixo em seu ombro. — Quero minha coroa feita de ouro — ela anunciou, a voz embargando. — Com safiras.

— Ouro branco ou dourado?

— Branco. Para combinar com o anel de noivado que me deu.

Bjorn assentiu, fechando os olhos por um instante, deitando a cabeça na curva do pescoço dela. Não adiantava adiar, as horas não iam passar mais devagar e tinha de se preparar para sair. Ele se levantou, pegando as roupas em cima do baú, separadas para a viagem. Quando começou a se vestir, Eva jogou o robe por cima do corpo e deixou o quarto.

Ele se vestiu devagar, como se desacelerar o processo pudesse adiar o destino inquestionável o aguardando do lado de fora. Felizmente, suas armas e armadura estavam com ele em Angelrode. Podia não ser aceitável andar armado de cima para baixo naquele país, mas seria louco de ir para tão longe de sua casa sem seu equipamento, decisão essa compensando agora. Ele ajeitou as roupas de lã no corpo, terminando de prender os cabelos com um cordão de couro, e pegou a mochila de couro com o equipamento dentro, a jogando por cima do ombro.

Bjorn caminhou devagar pelo corredor e pelas escadas, tentando focar seus pensamentos no que importava agora. Podia ganhar. Precisava se focar nisso.

Planejava deixar a mochila na porta e procurar Eva para se despedir, mas foi surpreendido ao ver um baú na sala pertencente à sua esposa, com um casaco de viagem pendurado no cabideiro ao lado.

— …Eva? — Bjorn chamou, olhando em volta, confuso, procurando pela esposa.

— Em um instante! — A resposta dela vou gritada do andar de cima.

Ele franziu a testa, imaginando quais seriam os planos dela. Havia pensado em sugerir à esposa passar a semana na casa do irmão, não gostando de imaginá-la sozinha, preocupada, enquanto ele lutava em um combate de vida ou morte.

O homem se sentou em uma das poltronas do hall de entrada, segurando a mochila no colo e se sentindo muito mais jovem e inexperiente que era. Depois de vários minutos, Eva apareceu, em trajes de viagem e acompanhada de uma das criadas, carregando mais uma bolsa atrás dela. Parecia muito para algumas semanas com o irmão, mas talvez fosse comum. Angelrodanos acumulavam muitas posses.

— Obrigada senhorita Williams, pode deixar aqui — Eva agradeceu.

A jovem colocou a bolsa ao lado da mala e se retirou para dentro da casa de novo.

Eva abriu um sorriso pequeno no rosto, fazendo um carinho no rosto de Bjorn, os dedos se demorando um pouco no desenho tatuado em sua cabeça onde raspara os cabelos na lateral.

— Como se sente? — Ela perguntou, apertando a mão dele de leve.

— Não sei. Não estou tentando pensar nisso, preciso me concentrar.

Eva assentiu, entrelaçando os dedos nos dele.

— O que é isso tudo? — Ele perguntou, indicando a mala da esposa. — Eu ia sugerir que você ficasse com seu irmão, mas não sabia o que ia dizer porque… Bem, estarei fora na lua cheia.

Passaram a última lua cheia juntos. Eva não quisera deixar o quarto, receosa de ser vista por criados ou qualquer outra pessoa, mas haviam se divertido assim mesmo jogando uma bolinha de um lado para o outro. O quarto parecia ter sido atacado por um furacão depois, mas Bjorn se ocupou de arrumar tudo antes de qualquer criado chegar pela manhã.

— Não é para ficar com William — ela respondeu, cruzando as mãos na frente do corpo. — Conversei um pouco com Sua Alteza Real, Sebastian, e ele arranjou para que eu me hospede em uma cidade próxima da costa ravena em seu país.

— …Sebastian? O que você vai fazer em Svațeară?

— Esperar você vencer. Quero estar perto o suficiente para receber as notícias rápido o bastante. E estarei segura lá, então…

— Eva —

— Não está aberto para discussão — ela cortou. — Você faz a sua parte, eu faço a minha.

Sempre amara aquele olhar determinado na esposa quando se decidia a fazer algo, e não era porque dessa vez a decisão não era sua preferida que iria desgostar. Além de tudo, se sobrevivesse, seria maravilhoso poder ter Eva ao seu lado mais rápido. Só havia benefícios.

— Certo. Combinado.

— Combinado.

Ela apertou a mão de Bjorn por um instante, e ouviram batidas na porta. Bjorn se adiantou para atender, ignorando a existência do mordomo e reagindo automaticamente já estando ao lado da porta. Do outro lado do portal, encontrou um chofer.

— Lady Evangeline?

— Sua carruagem — Bjorn comentou, vendo outra chegando logo em seguida. — E a minha também.

— Vai dar tudo certo, não tem com o que se preocupar — Eva comentou. — Ah! Mais uma coisa. — Ela enfiou a mão na bolsinha de couro, tirando uma fita de cetim azul de dentro. — Para você pensar em mim enquanto eu estiver esperando.

Bjorn sentiu os olhos lacrimejarem. Ele pegou a fita com delicadeza, entrelaçando os dedos nos de Eva por um instante breve, antes dela sair pela porta. E, simples assim, não havia mais como adiar.

O homem amarrou a fita ao redor da ponta de sua lança. Então, pegou suas coisas e partiu.

 

[…]

 

Planejar um ataque era difícil o suficiente, mas Yrsa odiava ainda mais planejar defesas. Para piorar, estava tendo de fazê-lo com o complicado plano traçado por Bjorn com os angelrodanos, algo incomum para kaldreses em seus combates.

Suas orientações incluíam preparar uma defesa do outro lado do Rio Jotun. Ficava a meio caminho na direção de Ulvegr, previsivelmente no trajeto a ser usado por Sigrid em seu ataque. Yrsa comandara a força marítima a posicionar os drakkars no rio, preparados para atacar a costa oposta a qualquer momento.

Fazia três dias. Ainda estavam ali, esperando.

Para tudo ocorrer como Bjorn planejara, Sigrid deveria ter partido de Ravnheimr quatro dias atrás. Isso a faria chegar na Passagem de Fenrir na primeira noite de lua cheia, e ali na margem do Rio Jotun, na terceira. Deveria ser agora. O sol acabara de se por, e ela esperava a chegada do batedor com notícias.

Não se desapontou.

Nos últimos instantes de espera, o batedor apareceu ao longe, montado em um cavalo, com a bandeira de Ulvegr erguida. Estava vindo rápido, como esperado de um batedor, mas havia algo em sua postura, na forma como segurava a bandeira, parecia vacilante. Teria sido atacado? Yrsa se levantou de um salto, sinalizando para uma sacerdotisa em um barco próximo.

— O que aconteceu? — Borg questionou, parado atrás dela com Elliði ao lado. O lobo parecia tão apático quanto em qualquer outro dia, mas Yrsa reconheceu a ruga de nervosismo na testa do irmão.

— O batedor voltou. Acho que é hora, irmão.

Borg assentiu, os braços cruzados com força, batendo um pé no chão insistentemente em um gesto ansioso. Trazia um machado de duas mãos às costas, e usava armadura encantada como os outros soldados, e Yrsa escolhera um conjunto de espada com escudo com os quais já estava mais acostumada.

— Que Odin abençoe seus passos — Yrsa desejou, pegando um frasquinho com um líquido azul de dentro do bolso.

— E os seus.

Eles apertaram as mãos por um instante, gesto seguido por Borg puxando Yrsa para um abraço apertado. Ela jamais admitiria, mas agradeceu a cada segundo do abraço que Borg fez durar, imaginando se poderia repetir o gesto algum dia. Reclamara do excesso de apego dele por toda a vida, mas agora daria qualquer coisa para poder ficar ali um pouco mais. Talvez o batedor não tivesse notícias, e precisassem atrasar a defesa.

— Lady Yrsa!

Não teria essa sorte. Ela se soltou do abraço, dando as costas a Borg sem pensar duas vezes. Era hora de ser responsável. Bjorn precisaria de tempo, e o trabalho deles ali era conseguir o quanto disso fosse possível.

O batedor estava passando de um drakkar próximo para o seu. Estava pálido, um pouco trêmulo, com uma visão de terror em seu rosto. A visão era como um péssimo presságio. Esperavam notícias de Sigrid ter partido, e estar se aproximando a esse ponto, mas aquela reação do batedor parecia significar algo totalmente inesperado. Se havia algo que Yrsa não queria agora, eram surpresas, principalmente do tipo capaz de aterrorizar seu batedor àquele ponto.

— Fale, Leif — ela pediu, tentando disfarçar o aperto firme no cabo da espada. Não podia parecer preocupada quando todos ali estavam olhando para ela e esperando que os guiasse para o sucesso com o plano de Bjorn.

— Ela está vindo… — o homem comentou, se agarrando a um soldado próximo e aceitando a ajuda dele para se sentar. — Mas, Lady Yrsa… aconteceu algo terrível.

— O quê?

A pergunta deixou os lábios de Yrsa quase trêmula. Sabia ser uma esperança tola assim que a proferiu, mas não pode se impedir de desejar boas notícias ainda assim. Poderiam lidar com um adiantamento. Por favor, que fosse um adiantamento…

— Ela está muito adiantada… Estará aqui hoje, vem com carruagens de bodes. Pode ir e voltar daqui até a capital dela em um dia, ou dois. E tem mais, Lady Yrsa. São os lobos…

Yrsa engoliu em seco. A expressão no rosto de Leif era tão aterrorizada que conseguia imaginar o quão ruim a notícia seria.

— Ela conseguiu muitos lobos?

— Mais que muitos, senhora… Dezenas.

Por um instante, Yrsa ouviu apenas silêncio. Foi como se o ar fosse arrancado de seu pulmão, e todo o som do mundo desaparecesse por um instante. Um apito distante ressoava em seus ouvidos, e ela quase conseguia ouvir o som das moiras se preparando para cortar uma incrível quantidade de fios de uma só vez.

— Ouçam! — Ela exclamou, de repente. — Sigrid está chegando, com dezenas de lobos em seu encalce.

Yrsa viu olhares de pavor começarem a tomar os soldados à medida que a mensagem se espalhava de um drakkar para o outro.

— A missão segue sendo a mesma! Bjorn precisa de tempo, e é para isso que estamos aqui! Sigrid pode jogar seus lobos, seus feitiços, tudo o que quiser contra nós, mas não vamos nos curvar!

Esperava mais empolgação, gritos de guerra e o som de chifres sendo soprados para entrar em combate. Pareciam todos congelados no lugar. Não poderia culpá-los. Haviam esperado uma luta justa, talvez até fácil, e agora poderiam estar caminhando na direção de um massacre.

— Odin nos ajude… — Ela murmurou, caminhando para a proa do barco. Então esperaram.

Sigrid chegou em menos de hora. Foi vista ao longe pelas luzes azuis das sacerdotisas flutuando sobre o que era um mar de lobos montados por soldados, marchando em sincronia em direção ao rio. Yrsa engoliu em seco e levantou a mão, fechada, em um sinal de espera.

— Arqueiros, preparem-se!

Desejou que Bjorn estivesse ali. Até o último segundo, não pode deixar de ter fé na crença de que ele poderia resolver tudo com uma conversa, mesmo agora, mas era apenas um sonho senil. Sigrid jamais desistiria com uma vantagem tão grande ao seu lado. Apenas esperava poderem segurá-la ali por tempo suficiente.

O batalhão de Sigrid estacou no lugar. Não conseguia vê-los com detalhes, e podia apenas deduzir o próximo passo da mulher pelo movimento geral. Pareciam ter parado de se mover, então seria melhor se pudessem atirar primeiro.

— Apontem — ela ordenou, dando um instante para os arqueiros fazerem suas miras. Então abriu a mão, apontando-a para a frente. — Vá!

O céu se encheu de flechas com pontas em azul brilhante de seiðr. Sigrid estava preparada o suficiente para isso, e suas sacerdotisas cobriram regiões do batalhão com escudos aéreos de seiðr. A maioria das flechas acertou os escudos e caiu no chão, mas algumas passaram por entre eles, encontrando alvos em soldados e seus lobos.

— Preparar — ordenou mais uma vez. Não queria dar a ela tempo demais para pensar. Tinham a vantagem territorial por estarem defendendo do outro lado do rio, mas com aquela quantidade de lobos não sabia por quanto tempo.

Não conseguia identificar Sigrid daquela distância, mas viu alguma movimentação na frente e assumiu ser a estratégia defensiva dela. Preferia não dar tempo para ela colocar qualquer coisa em prática, precisava se adiantar.

— Apontar… Vá!

Mais uma saraivada de flechas. Se Sigrid podia voltar em um dia ou dois com as carruagens, precisavam segurá-los ali ao máximo, ou destruir as carruagens. Talvez as duas coisas. Infelizmente, as carruagens não estavam à vista, e para chegarem nelas, precisariam atravessar o batalhão, destruindo a vantagem conquistada ao estarem do outro lado do rio. Era um impasse.

A única vantagem em seu lado agora a distância do rio. Lobos sabiam nadar, mas não podiam fazer isso e lutar ao mesmo tempo, e se abririam completamente a ataques se Sigrid tentasse a travessia. Então ela não iria tentar, e Yrsa não ia perder sua vantagem. Se continuassem nessa posição, poderiam ganhar.

Mas Yrsa sabia que não continuariam nessa posição. Sigrid não iria ficar parada ali permanentemente, ou ia dar um jeito de avançar, ou iria recuar, e não podiam permitir que ela recuasse essa noite. Era uma noite essencial. Ela tinha de estar ali até o nascer do dia, ou voltaria a Ravnheimr antes da hora.

— O que acha? — Borg perguntou, cruzando os braços ao seu lado enquanto Yrsa coordenava os ataques de flecha.

Mais complicado que tentar ganhar uma batalha, era tentar alongar uma. Yrsa nunca tivera problemas para coordenar ataques destrutivos, então algo calculado como isso estava atacando o fundo de sua mente.

— Não sei — ela respondeu. O batalhão de Sigrid avançara um pouco mais, chegando quase na margem do rio, mas ainda com algum espaço de terra à sua frente.

— E se jogarmos o rio nela?

— Se fizermos isso, e não adiantar, destruiremos a barreira natural nos afastando dela e os lobos que sobrarem vão nos destruir.

— Você acha que ela vai tentar fazer isso ela mesma?

Yrsa engoliu em seco. Se achava? Tinha certeza, por isso estava com a maioria das sacerdotisas em seu batalhão. Eventualmente ia virar uma briga de seiðr contra seiðr e não fazia a menor ideia do quão boas eram as sacerdotisas do outro lado, mas o fato de haver tantos lobos eram preocupantes. Se a água não fosse mais um problema, estariam acabados.

Mais uma saraivada de flechas. Yrsa apertou os olhos, vendo uma silhueta se movendo agitada de um lado para o outro do outro lado, mas por muito tempo, nada mudou.

Então ela começou a atirar de volta. Por estarem em cima dos drakkars, estavam em terreno um pouco elevado, o que tornava Sigrid atirar neles um processo um pouco mais complicado que o oposto, mas não a impediu de tentar. As sacerdotisas já estavam de prontidão, e ergueram escudos de seiðr em cima dos drakkars, mas agora que Sigrid configurara uma posição para revidar o ataque, a dinâmica mudara.

Yrsa não podia atacar com tanta frequência porque as flechas não atravessariam os escudos de seiðr para fora dos barcos. Ou atacava, ou defendia, e precisava encaixar esses momentos no meio das mesmas decisões tomadas por Sigrid. Se tornara uma guerra de cronometragem, mas ao menos isso era uma boa notícia. Levaria tempo para qualquer avanço acontecer. Talvez a noite inteira, se tudo continuasse assim, mas nesse caso Sigrid desperdiçaria uma noite de lua no mesmo lugar. Talvez ela não quisesse isso.

As horas passavam em um impasse. Yrsa sentiu o pescoço se tencionar conforme coordenava as minúcias da dança entre os arqueiros e as sacerdotisas. Algumas pessoas haviam sido atingidas, e quando isso acontecia precisava dispensar uma sacerdotisa para primeiros socorros, arriscando as defesas momentaneamente. A lua ficou alta no céu, e a situação permanecia a mesma por muito tempo, mas Yrsa sentiu algo mudar. Estava no ar, na movimentação do outro lado. Na forma como as luzes das sacerdotisas se moviam.

— O que ela está fazendo? — Yrsa perguntou, em um murmúrio ansioso. Estava longe de se considerar satisfeita com o progresso feito, ainda tinham horas para segurar por ali, e horas poderiam fazer muita diferença.

— Não sei, não consigo enxergar — Borg respondeu, parecendo igualmente ansioso ao seu lado.

Yrsa resmungou, irritada, se segurando no mastro, se inclinando na proa para ver mais longe. Então, depois de um bom tempo se esforçando, identificou: ela estava recuando.

— Não é possível — reclamou, ainda relutando com o que seus olhos viam.

Mas não havia como estar errada. As luzes estavam erráticas, e embora os escudos das sacerdotisas permanecessem firmes no lugar, era possível ver começarem a marchar para trás. Se retornassem agora, estariam em Ravnheimr um dia antes de Bjorn. Todo o plano iria por água abaixo.

Literalmente, talvez. Talvez precisasse exatamente fazer isso.

Ela suspirou, olhando para a espada em sua mão. Sempre imaginara que cair em batalha seria seu destino, cedo ou tarde, e embora não tivesse considerado que estaria chamando a batalha de sua morte ela mesma, não podia negar que havia formas piores de ir. Ao menos estava cumprindo seu papel de capitã, até o fim.

— Sacerdotisas — chamou, a voz ecoando para os barcos próximos. — Lavem a terra com as águas do rio.

Ela sentiu um segundo de hesitação ecoando, mas foi breve. Logo o ar se encheu de seiðr, e o rio começou a se agitar, bravio sob os barcos. Algumas sacerdotisas se ocupavam de manter as embarcações estáveis, enquanto outras erguiam a água pelo ar, gradualmente, formando colunas de água cercadas de seiðr entre os barcos.

Os ravenos pararam por um microssegundo, olhando assustados para trás. Então, Sigrid gritou uma ordem e suas sacerdotisas se viraram, usando a seiðr para tentar barrar a água do rio do outro lado.

— Arqueiros! — Yrsa chamou, não querendo perder nenhuma chance. Ou as sacerdotisas protegiam os ravenos do rio, ou das flechas, e qualquer uma das coisas que os alcançasse agora seria bem-vinda. — Atirem, vá!

As flechas cruzaram o ar. Como Yrsa esperava, as sacerdotisas precisaram começar a se separar entre protegê-los das flechas e da água enquanto recuavam, e Sigrid tinha de escolher entre isso ou atacar de volta.

Não ia dar a ela a chance de escolher.

Yrsa sinalizou para suas sacerdotisas, e a água do rio foi atirada violentamente para a frente.

A inundação lavou a terra da margem, varrendo o descampado em direção aos ravenos. Eles corriam para trás, desesperados, as sacerdotisas se preocupando com desviar o quanto de água poderiam. Qualquer tentativa de recuar agora estava atrapalhada pelo curso bravio da água, e os soldados eram atirados de um lado a outro, buscando um caminho para escapar.

O barco balançava com força de um lado a outro, abaixando conforme o leito do rio descia. Alguns encalharam na margem oposta e, deixando os soldados abertos a um confronto direto com os ravenos.

— Segurem eles aqui! — Yrsa ordenou, saltando do barco quando a água já estava na altura dos calcanhares.

— Yrsa! — Borg chamou. — Yrsa, o que vai fazer?

— Sigrid não pode voltar agora, vai acabar com tudo. Bjorn precisa de tempo, Borg.

— Eu sei… Mas…

— E você vai ficar aqui — ela reafirmou, se aproximando do barco e estendendo a mão para segurar a do irmão. — Se algo acontecer comigo… e com Bjorn… só vai sobrar você para cuidar de Ulvegr por nós, nem que seja sob o jugo dela. Então eu te ordeno que saia de combate, entendeu?

— Nem ferrando, Yrsa. Você está maluca se acha que —

— É uma ordem! Fui apontada capitã dessa divisão, e eu estou mandando você voltar, ok? — Ela ordenou, algo se apertando em sua garganta. Não queria chorar logo antes de entrar em batalha, era a última coisa de que precisava, mas não conseguiu conter. Algo lhe dizia que ela e Borg nunca mais se veriam.

Ele parecia incapaz de responder. Então, enfiou a mão no bolso, tirando uma latinha de estanho dele. Dentro, havia um pouco de tinta azul. Borg passou um dedo nela e se aproximou de Yrsa, gravando uma runa na testa dela.

— O que está fazendo?

— Te dando uma chance de vencer.

Nesse instante, Elliði saltou do barco. Yrsa sentiu sua conexão com ele ser ativada, um pouco trêmula. Ele estava nervoso, e os dois não se conheciam ou se davam tão bem quanto ele e Borg, mas mesmo assim a conexão se firmou. Ela queria que Borg estivesse a salvo, e percebeu surpresa que Elliði também. Havia uma dor na mente dele, algo escondido por baixo da camada de instinto de ataque lupino muito parecida com o que ela sentia agora.

Ele o amava também.

— É melhor vocês voltarem — Borg anunciou. — Por Odin, voltem.

Yrsa não respondeu. Ela trocou um abraço desajeitado com o irmão pela diferença de altura. Então Elliði se abaixou e ela subiu em suas costas, segurando na sela de batalha e correndo em direção ao campo de guerra que se formara em sua frente.


Notas Finais


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