Muitos dias se passaram desde os encontros.
A quarta-feira se arrastava com uma lentidão dolorosa. Sequer poderiam mensurar quanto tempo eles estavam gastando naquela rotina altamente nociva, onde apenas contentarem-se com salgadinhos, refrigerantes e doces, dormindo durante as aulas e assistindo filmes e mais filmes para passar o tempo. Kakyoin havia perdido a vontade de jogar videogame, Caesar sequer mostrava interesse em atender as ligações de sua mãe e Dio havia parado com suas brincadeiras ácidas.
De fato, aqueles encontros destruíram eles. Então, apenas por isso, eles tentavam se distraírem com baboseiras na televisão.
– Vai lá, idiota, corre de volta para ele... – Dio resmungava, com os olhos fixos na televisão. Estava passando um filme deveras antigo e clichê, daquele tipo que até se contrai diabetes de tão doce que é.
– Ela vai se ferrar. – Kakyoin sorriu com escárnio. Caesar se limitou a um sorriso debochado.
Todos eles tinham plena ciência do estado deplorável que se encontravam: esparramados no pequeno sofá, profundas olheiras abaixo dos olhos, enrolados com moletons antigos e nem tinham se dado o trabalho de tomar um banho naquele dia. Aliás, combinaram de faltar aula. Mas como poderiam culpar uns aos outros? Cada um teve seu dia de merda, e estavam lidando com isso da melhor forma que podiam.
E se essa forma incluísse se acabar em mais comentários maldosos e óbvios sobre filmes dramáticos antigos, com uma qualidade tão medíocre quanto eles mesmos, enquanto se empanturravam de salgadinhos baratos de mercearia e refrigerantes de limão, que assim fosse.
Não foi por livre e espontânea vontade que eles resolveram assistir filmes daquele naipe. Aí seria um golpe baixo demais. No entanto, a Netflix é tão astuta que acabou colocando opções românticas bem antigas como recomendação para a conta de Caesar. Sem ânimo algum para procurar outro gênero, acabou sendo aqueles mesmo.
No meio da segunda parte do terceiro filme, um celular começou a tocar.
Kakyoin observou se era o seu, mas percebeu que era o de Dio.
– É o número do Joseph te ligando. – O ruivo cutucou Brando, que olhou para o celular como se ele fosse algo indigno de sua atenção. Caesar tomou posse do celular, desligando-o imediatamente.
– Eu o bloqueei de todas as minhas redes sociais e da minha linha de celular. – Zeppeli devolveu o celular a Dio, que se manteve calado o tempo inteiro, focado no filme. – Ele vai ficar tentando ligar para vocês para conseguir falar comigo. E eu peço que não atendam.
Logo, o silêncio reinou novamente sobre o dormitório, sendo maculado apenas quando a necessidade de causticar os filmes era mais forte que a vontade de ignora-lo. Pouco antes do final, o celular de Kakyoin começara a tocar.
– É a Erina... – O ruivo suspirou, olhando para o número chamando sem empolgação alguma. Tanto Dio quanto Caesar o encararam, expectantes.
– Não vai atender? – Caesar indagou, ajeitando-se no sofá.
– O que tenho para falar? – Kakyoin ameaçou deslizar para desligar, mas não esperava que Dio fosse roubar o seu celular e atendesse a ligação.
– O que você quer de nós, agora? – Dio fez menção de se levantar do sofá, sendo tensamente observado por seus colegas. – Seu filho fodeu com nosso encontro, e graças ao Diego, estamos todos na pista, agora. – Um silêncio fleumático perdurou. Um dos dedos de Kakyoin era castigado em sua boca, tamanha ansiedade. A face de Dio contraiu-se com desgosto. – Sabia? Ao inferno, Erina. – Mais uns segundos dolorosos se demoraram. – Se você realmente fez isso... Erina Brando, eu vou... – Ele calou-se, depois grunhiu, irritado. – Que seja, pode ser. Na cafeteria Bougainvillea, às três da tarde.
Logo mais, Dio desligou. Kakyoin e Caesar o encaravam, esperando que ele os contasse o que havia acabado de combinar com a irmã. O Brando encarou-os com um desdém brincalhão, como se eles fossem filhotinhos feios.
– Que caras são essas? – O loiro indagou, enquanto abanava suas calças de moletom.
– Não vai nos dizer o que acabou de conversar com a sua irmã? – Caesar apontou, com obviedade. Kakyoin aconchegou-se ainda mais no sofá.
– Vocês saberão quando chegarmos. Agora, vamos tomar um banho, porque a situação da gente está crítica.
* * *
– O que acha que ela quer conversar? – Noriaki voltou-se discretamente para Caesar, enquanto apressava ainda mais os passos para mudar de calçada.
– É um palpite, mas eu acho que ela quer falar de como foi cada encontro. – Zeppeli passou a mão no queixo, sentindo que sua barba já estava começando a pinicar.
O movimento na cafeteria não era muito, mas também não estava vazia. Um ambiente agradável, ainda mais se acrescentado ao tempo frio e chuvoso que moldava a temperatura externa. Kakyoin trincou os dentes ao sentir o ar gelado da cafeteria esbofetear seu rosto. Era um insulto aquele ar-condicionado estar ligado.
– Olha ela ali. – Dio apontou para a irmã, que usava um vestido de alças finíssimas cor ciano, com frente lisa e decote em U, e com a saia cheia de bordados mais escuros. Caesar se perguntou se ela era imune ao frio. Diego estava logo ao lado, surpreendentemente quieto e os dinossauros abandonados sobre a mesa. Quando se aproximaram, Erina acenou, mas logo então os três perceberam algo assustador.
Ela não estava sorrindo. Parecia triste e decepcionada. E isso foi o suficiente para que eles começassem a desconfiar que algo muito ruim estava prestes a acontecer.
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